No E. P. R. Guimarães era sempre a mesma rotina. Numa detenção quando a
G. N. R. de Fafe foi entregar um recluso à cadeia mediante mandato de detenção
estava no Gabinete da Chefia e ouço berros à entrada da Portaria. Desloquei-me
ali para me inteirar do sucedido. Era a G. N. R. a ser insultada e o recluso
negava-se a abandonar o Jipe. Disse-lhe: venha daí. De imediato acompanhou-me
para a Portaria a fim de procedermos à respectiva formalidade documental. Já o
conhecia há bastante tempo e por nós havia um certo respeito.
Um dia numa diligência ao tribunal Judicial de Fafe, um recluso efectuou
dali uma fuga. Enquanto o guarda tratava da apresentação o recluso efectuou a
fuga mesmo algemado. Os guardas que faziam a custódia eram dois incluindo o
motorista perseguiram-no até à casa do recluso, residia perto do tribunal,
quando lá chegaram foram recebidos por um irmão de arma na mão. Era uma família
que entre mãe, filha e dois filhos por várias vezes passaram pela cadeia só o
pai é que não.
A directora nomeou-me instrutor do processo. Fiz diligências nessa
secção para ouvir os funcionários. Não fiquei convencido com as declarações que
prestaram e nas conclusões finais mencionei isso.
Fez-me lembrar numa diligência feita ao tribunal Judicial de Lousada
com um recluso para julgamento e depois de se saber que ia ter continuação da
parte de tarde, chegou um funcionário do tribunal junto do guarda motorista e
disse. “Como o julgamento continua da parte de tarde o Sr. Guarda podia deixar
o recluso ir almoçar com os seus familiares”. Encontrava-me próximo e não
acreditava no que estava a ouvir. O guarda motorista disse: está ali o Subchefe
de Guardas peça-lhe autorização. Quando o funcionário se dirigia a mim,
disse-lhe: assine a guia de presença em como o recebeu depois pode fazer com o
recluso o que entender. Não aceitou o proposto, segui com o recluso para o E.
P. e de tarde lá comparecemos. Pimenta no rabo dos outros para nós é um
refrigerante.
O Subchefe de Guardas, Teixeira, ficou aprovado no curso e foi nomeado
para chefiar o E. P. Coimbra. A directora nomeou-me para chefiar o E. P.
Feminino de Felgueiras. Já o conhecia assim como a corporação e a população
prisional. Não tive problemas. Era só dar continuidade. Havia reclusas de todo
o tipo; velhas, novas, bonitas, feias, ciganas, de cor e estrangeiras, mas a
maioria portuguesas. Havia uma que era a faxina da lavandaria, bem-parecida,
com um corpo escultural, estava constantemente a pedir para ser recebida por
mim. Quando entrava no Gabinete da Chefia a primeira coisa que fazia era fechar
a porta. Dizia-lhe para a abrir que sofria de claustrofobia. Noutro tempo a
Cadeia estava sobre o comando do E. P. Porto e na passagem de ano foi lá um
forrobodó, guardas a dançar com reclusas. Houve um inquérito. Depois de
concluído a cadeia foi encerrada temporariamente.
Com o tempo fui notando uma certa simpatia e algo mais, para comigo,
mas nunca dei importância a esses pormenores. Um dia o guarda motorista
disse-me que esteve a falar com o marido de uma cigana, que estava ali presa,
que lhe mostrou ciúmes em relação a mim. Já tinha notado esse pormenor sempre
que pedia para a receber no meu gabinete, perfumava-se toda. Não podia suportar
o odor. Quando me dirigia à zona prisional e passava por ela não cheirava
assim. Como fui sempre a favor de certos ditados, entendo que, “onde se ganha o
pão não se deve querer comer a carne.” As reclusas tinham bom comportamento. Havia
alegria. De vez em quando começavam com cânticos e cantavam bem. Principalmente
o “Apita o Comboio.”
O juiz do Tribunal de Execuções de Penas do Porto (T. E. P. P.) era o
Dr. Dias Ferreira. Conhecia-o do E. P. Paços de Ferreira, era simpático e amigo
das reclusas. Só não concedia saída precária se o Conselho Técnico fosse todo
desfavorável. Mesmo assim, quando chegava ao fim de todas serem vistas
perguntava não é melhor revermos as outras situações. Íamos buscá-lo à central
de camionagem de Felgueiras para ganhar algum tempo e poder depois do Conselho
Técnico almoçar à vontade. Perguntava sempre se havia maçã? Era a sua fruta
preferida para a sobremesa. Depois de almoçar levávamo-lo outra vez à central
de camionagem para apanhar o autocarro que saía por volta das doze horas e
quarenta e cinco minutos.
Andava sempre com pressa. Deslocava-se para Felgueiras em transporte
público e os horários eram poucos. Perguntava-me se não havia outro tipo de
transporte. Andava sempre numa correria. Dei-lhe como alternativa uma vez que
passava sempre em Lousada - ia em transporte próprio - esperava pelo autocarro
e depois ele seguia dali comigo e adiantava um bom pedaço de tempo. O autocarro
de Lousada a Felgueiras fazia uns desvios e demorava quase o mesmo tempo que do
Porto a Lousada. Assim se fez, sempre que havia Conselho Técnico, éramos
notificados antes uns dias, mas na véspera telefonava sempre a lembrar a sua
vinda. Faço referências ao Meritíssimo Juiz, Dias Ferreira, pelo seu
profissionalismo e bondade, o que é raro num juiz e por ter morrido há anos motivado
por um cancro.Continua
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