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terça-feira, 18 de novembro de 2025

Consultoria política – Como debater com um chunga:

Seguro não esteve mal frente a Ventura. Poderia até ter ficado bem no retrato, caso tivesse continuado a apertar o chunga quando o encostou aos números. Só que, por não ter estratégia para tal, consolou-se com a vitória táctica numa casual escaramuça e desperdiçou o que poderia ter sido a vitória na batalha.

Todos nós, adultos e grande parte dos adolescentes, já privámos com tipos como o Ventura. Uns com maior intimidade, outros com menos, pudemos ver esses seres em acção nas conversas de rua, nas escolas, na noite, no desporto, no emprego, na família. São, tecnicamente, “ciganos”. É um termo cunhado por séculos de estigmatização que merece ser recuperado para descrever quem ataca gravemente a comunidade cigana. Nesse sentido popular em que “cigano” é um sinónimo vernáculo de burlão, velhaco, trapaceiro, biltre, o Ventura entra na categoria do “ciganão”. Tudo nele corresponde a essa caricatura, a qual não quer esconder, ao contrário. Esse estilo vale actualmente 60 deputados no Parlamento, deu-lhe a mirabolante posição de segunda força política nacional à frente do PS, e tem merecido encómios do editorialismo e comentariado que repetem estarmos perante alguém “muito inteligente”, dotado de um poder de comunicação superior à concorrência. Seguro, confirmando não ter noção do que tinha de fazer, repetiu essa ideia amiúde no debate com a ingénua intenção de ser desconstrutivo e negociar uma trégua; mas tendo como único efeito a promoção da marca do interlocutor.

A exposição mediática de Ventura, nestes anos de ascensão meteórica, é tal que fica como paradoxo, se não for mistério insolúvel, ainda não ter aparecido vivalma que consiga lidar com ele. Isto é, alguém que o meta no seu lugar. Que lugar é esse? É o lugar da mais crassa, vil, perigosa ignorância. Porquê? Porque se trata de uma ignorância metodológica. Como com todos os populistas e candidatos a tiranetes, o sucesso nasce de se explorarem os segmentos mais fragilizados da população. Idosos e jovens, pobres e deprimidos, remediados e ressentidos, esta manta de retalhos de iliteracias e défices cognitivos não quer saber do Estado de direito ou da Constituição, nem que lhes expliquem as complexidades e constrangimentos das questões governativas e da administração do Estado. Eles querem é vingança, uma história aparvalhada e mentirosa que consigam perceber, e o prazer de se fantasiarem como vencedores. Há oceanos de literatura sobre este fenómeno que sempre assim foi, sempre assim será.

Que fazer? Fazer perguntas. Os debates com o Ventura deviam ser dedicados exclusivamente ao Ventura. Não têm interesse para mais nada pois o pulha vai boicotar qualquer racionalidade dialógica. Então, não vale a pena, a quem se vai meter num estúdio com ele para 30 minutos de cegada, tentar discursar para a sua própria base eleitoral ou para indecisos, ainda menos para a base de apoio chegana. A única utilidade consequente de um debate com Ventura é o serviço público de o levar ao tapete. Seguro prometeu ir fazê-lo, quando lhe perguntou pela percentagem de imigrantes do Bangladeche. Mas essa foi apenas uma pergunta em mil possíveis face a quem assume o desprezo pela tradição religiosa e moral do cristianismo, a quem alimenta o desprezo pelos direitos humanos, a quem atiça o desprezo pela democracia e a liberdade nascidas com o 25 de Abril.

Ventura diz-se católico praticante, é filmado e fotografado em igrejas a participar em liturgias e outras expressões de fé, afiança que Deus lhe confiou a “difícil mas honrosa missão de transformar Portugal”, foi a Espanha agradecer ao fundador do Opus Dei os resultados eleitorais em 2022. Ao mesmo tempo, persegue minorias e imigrantes – e, portanto, viola espectacularmente a tradição milenar, fundada nos Evangelhos, de hospitalidade e caridade incondicionais para estrangeiros e estranhos. É ler Mateus, é ler a Regra de S. Bento, para só referir o básico do básico. Como é que foi possível chegarmos a Novembro de 2025 e ninguém ainda lhe ter perguntado em que parte da vida de Jesus se está a inspirar?

 por Valupi

Do blogue Aspirina B

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