E. P. Tires
Passado pouco tempo abriu concurso para Subchefe de Guardas ao qual
concorri. Fiz provas escritas e físicas, fiquei bem classificado e em 1987 fui
frequentar o curso para Tires. Ficamos instalados num edifício que foi uma
cadeia. Dormíamos em celas, tínhamos que fazer todo o tipo de faxina: limpar os
quartos de banho, lavar a louça, incluindo pratos e panelas, pôr e retirar a
comida, limpar os corredores, tirar as ervas, cortar relva e limpar os jardins.
Nunca vi coisa assim.
Faltava pouco para terminar o curso, um Técnico Superior de Vigilância,
que nos dava instruções para defesa das instalações, resolveu dar-nos um
exercício com o lançamento de gás lacrimogéneo, tínhamos viseiras, mas faltava
os filtros de ar para podermos respirar e aqui inalei bastante gás lacrimogéneo.
Julguei morrer abafado - não queiram passar por esta experiência. Estas
situações dão-nos as mais díspares reacções e a que me deu foi de abandonar o
curso. Fui impedido pela maioria dos meus colegas. Faço estes reparos porque
nos impusemos e a partir daí, todos os cursos ministrados quer de Subchefes ou
Guardas não foram mais assim.
Estive um ano à espera de ser promovido. Nesse tempo desempenhei
funções de Graduado de Serviço. Um dia o recluso Mário da Luz, de origem
Cabo-verdiana, foi punido com oito dias de cela habitação a cumprir no Pavilhão
de Observação. É um pavilhão destinado a castigos mais graves. Foi incumbido o
Subchefe de Guardas, Godinho, para lhe ler a ordem de serviço e levá-lo para o
dito pavilhão. Acompanhava-o nessa diligência mais os guardas Américo Santos e
Afonso. Após lhe ter sido lido a ordem de serviço e de ser dito para preparar
os haveres que podia levar, de um momento para o outro puxou de uma faca que
tinha na manga do surrobeco (espécie de samarra) e desferiu dois golpes, um no
cachaço, outro no abdómen, do Subchefe. De imediato fechamos o recluso para
socorrer o Subchefe. Estávamos no terceiro piso.
Depois de socorrido e de ter ido para o Hospital de S. João, fomos à
cela do recluso para acabarmos de cumprir a ordem e deparamos com a cela
trancada por dentro. O recluso estava preparado para o que desse ou viesse. Deu-nos
bastante trabalho. Tentou esfaquear outro guarda. Levou algumas cacetadas. Tive
que me impor. Achei que era demasiado. Acabei por ter a maioria dos guardas
contra mim. Não me importei. Dei a demonstrar que a nossa atitude tinha de ser
proporcional senão éramos todos iguais. E nós éramos agentes de autoridade e não
assassinos.
Foi levado para o Pavilhão de Observação chamou-se o enfermeiro para o
tratar. Mais tarde foi para o Hospital de S. João, no Porto, tendo seguido para
o Hospital Prisional S. João de Deus em Caxias. Depois foi transferido para o
E. P. Linhó, teve atitude igual, esfaqueou outro Subchefe, acabando por morrer
naquele E. Prisional.
Em Junho de 1988 fui promovido e como tinha pedido para ser colocado na
Cadeia de Apoio de Guimarães, o Director fez uma promoção simples e desejou-me
as maiores felicidades mas, sem deixar de dizer, que não contava que eu pedisse
a transferência. Disse-lhe que entendia que devia ser transferido, ainda hoje
entendo, que em qualquer promoção e não só, se devia ser transferido, ainda que
passado, uns dois a quatro anos regressássemos.Continua
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