O grego (ateniense) Pisistratus é considerado pelos estudiosos da
política como o primeiro populista demagogo na história ocidental. É o mais
antigo populista demagogo. Marcelo Rebelo de Sousa não é o primeiro populista
demagogo de Portugal, mas é o de maior sucesso, o mais activo e a funcionar 24
horas por dia.
Pisistratus pretendeu ser arconte de Atenas, o detentor dos poderes
reunidos do basileu, o rei, e do comandante dos exércitos, o polemarco. Marcelo
Rebelo de Sousa, além dos poderes do basileu e do polemarco pretende concentrar
o poder do arconte tesmótetas, o que preparava as leis e velava pela sua
execução.
Marcelo quer ser rei, general, chefe do governo e presidente da
assembleia. Qualquer coisa entre um cocktail e um shot.
Pisistratus descobriu cedo que o povo era facilmente iludido por gestos
simbólicos e a sua primeira medida como arconte foi transformar-se num “homem
do povo”. Marcelo fez também a mesma descoberta com tenra idade, no início da
carreira. Filho de ministro do Estado Novo, jornalista, professor de Direito,
jurisconsulto, chefe partidário, administrador de casas ducais, amigo de
banqueiros e comentador televisivo surgiu também como a voz do povo e um homem
do povo que beija ao vivo velhinhas, dá de comer a sem-abrigo e bebe ginginhas
no Barreiro, além de ir a Fátima em peregrinação e à bola para aclamação! São
os afetos! Tão populares e consoladores como os coiratos à porta dos estádios.
Pisistratus, o pai do populismo, fazia campanha como herói triunfante,
e era carregado aos ombros do povo como guerreiro vitorioso sem jamais ter
participado numa batalha ou vivido um desafio. Marcelo também não possui no
currículo nenhum feito heróico, nem de relevo que o ice ao Olimpo, a não ser o
banho no Tejo e umas voltas em Lisboa ao volante de um táxi, mas fala como se
tivesse soprado a Lua, saneado as contas públicas, apagado os incêndios
infernais, enchido as barragens, canonizado os pastorinhos de Fátima,
distribuído a raspadinha e impedido as invasões dos produtos chineses.
Ao longo dos séculos todos os Pisistratus fingiram demonstrar empatia
para com os sofrimentos dos mais carentes e excluídos da sociedade, como
Marcelo tão bem finge. Mas a comiseração dos populistas tem como único objetivo
a obtenção do voto, do aplauso fácil, da aclamação. É o que faz mover Marcelo.
Sempre que acreditarmos nos carinhosos abrações e nas selfies de Marcelo
devemos ter a consciência de estar a ser hipnotizados por um Pisistratus
moderno.
O populista apela à simpatia do povo para construir o seu poder. Baseia
o seu discurso na denúncia dos males que as classes privilegiadas causam no
povo. Apresenta-se como redentor dos humildes. O populista divide a sociedade
em dois grupos homogéneos e antagónicos: o ‘povo simples’ e a ‘elite corrupta”.
O populista assume-se como o único que representa o povo contra os corruptos,
mesmo contra as leis. Aí temos de novo Marcelo, o sorriso de Marcelo, o palpite
de Marcelo, o recado de Marcelo, a facada de Marcelo.
O populista universal é um narciso apaixonado por si, que se orgulha
tanto da sua irresponsabilidade como da sua inimputabilidade. Marcelo é o
demagogo que se coloca acima da lei da divisão de poderes em nome do povo que
vota em quem tem o dever de elaborar as leis. O demagogo, como Marcelo, entende
que fala directamente com o povo, que é a voz de deus, embora, logo de seguida,
beije as mãos dos padres com beata genuflexão.
Um populista narcísico como Marcelo, se chegar à conclusão que alguém
pode fazer-lhe sombra, tentará minar o seu prestígio e reputação. Balsemão e
Portas queixam-se dessas caneladas que deixaram nódoas.
Marcelo Rebelo de Sousa está constantemente preocupado com fantasias de
poder e sucesso. Crê ser especial e faz tudo para lhe reconhecerem essa
qualidade. Exige admiração dos outros e sente “estar no seu direito”
aproveitar-se dos outros para benefício próprio.
As acções e as aparições de Marcelo Rebelo de Sousa, os seus gestos e
as suas expressões de afectos têm como finalidade fazer dele o centro das
atenções.
Acredita que possui todas as qualidades. Prefere atuar sozinho, sem dar
espaço aos outros ou delegar funções. Apenas exige que os outros façam o que
lhe convém. É essa a razão do jogo perverso de gato e rato que impôs a António
Costa após os incêndios do Verão. Os incêndios no centro do país mostraram
Marcelo Rebelo de Sousa como um jogador com ases na manga e dados viciados.
Ele é e faz tudo para o ser o “funcionário do dia”, o “funcionário da
semana”, do mês, do ano, “o funcionário modelo”. Na antiga União Soviética
seria um herói do trabalho. Quer que a sua fotografia, a sua imagem fique
pendurada nas paredes dos locais que visita, que todos saibam quem ele é e o
que fez.
O populista, com a sua doentia necessidade de reconhecimento, é um tipo
inseguro, que não confia em si próprio. Perigoso porque está à mercê dos
sabujos que lhe preenchem o vazio, dizendo e gritando que ele é o bom, o capaz,
o conseguidor, o salvador, ou que produzem os elogios que o fazem sentir-se
inchado, diante do espelho.
Vemos Marcelo Rebelo de Sousa na televisão e podemos achá-lo engraçado,
mas na verdade ele é um populista. Um populista simpático, mas um demagogo
egoísta e narcísico.
Os portugueses votaram maioritariamente nele. Há que o aceitar como é e
decifrá-lo.
Por Carlos Matos Gomes
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