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domingo, 29 de março de 2015

Pela boca morre o rating:

Em março de 2011, pouco mais de dois meses antes das eleições, o então aspirante a secretário de Estado Adjunto do primeiro-ministro dizia, a propósito do rating da República portuguesa, que mal as agências de notação ouvissem dizer que o PSD ia para o governo, a avaliação de risco mudaria imediatamente. A tese de Carlos Moedas era simples e, porventura, verdadeira: "Há muito tempo não dão credibilidade ao governo português." Pedro Passos Coelho, então líder da oposição, alinhava pelo mesmo diapasão: "Os mercados não acreditam no governo."
Intrépido e audaz, Moedas haveria de ir mais longe no vaticínio ao assegurar que, uma vez confrontados com o programa de reformas que o PSD pretendia aplicar mal chegasse ao poder, os agiotas da finança não teriam outro remédio que não fosse mudar de opinião e subir o rating nacional. A história, como é óbvio, não lhe deu razão. Na primeira semana de julho, já com o programa de governo aprovado e com o enérgico Moedas promovido a capataz da troika, a confiança em Portugal foi posta no lixo. Era o primeiro "murro no estômago" do governo liderado por Passos Coelho.
Passados quase quatro anos, a situação não mudou. Ou melhor, mudou. Carlos Moedas é comissário europeu. Temos, garante a ministra das Finanças, os "cofres cheios" e previsões de crescimento nunca vistas, que variam entre os 1,2% dos mais pessimistas e os 2% dos mais ufanos. As taxas de juro da dívida pública portuguesa, quase 130% do PIB, estão, reconheça-se, em mínimos históricos em todas as maturidades. Mas por conta do programa lançado por Mario Draghi para compra de dívida europeia pelo Banco Central Europeu. De caminho, foi o rasto de destruição que se conhece. E o país, dizem-nos a cada passo, está muito melhor mesmo que para isso a vida das pessoas tenha de ter ficado muito pior.
Dos mercados chegam-nos notícias de arromba. Éramos lixo e lixo continuamos. Mas agora com pedigree. Somos lixo "estável", classifica-nos a Fitch, que é como quem diz, de qualidade. Passos Coelho e Maria Luís são, afinal das contas, uns incompreendidos. Diligentes e bons alunos, impõem sacrifícios e empobrecem as famílias para aforrar os cofres do Estado. E a paga que as agências de rating têm para lhes dar é uma medalha de entulho, de boa estirpe é certo, mas de entulho.
A desconfiança da Fitch, mesmo resultando do desprezo que os avaliadores do risco têm pela democracia - num statement recente de um analista era afirmado, preto no branco, que um dos maiores problemas que Portugal enfrenta são as eleições legislativas de 2015 -, está em linha com as previsões das instituições internacionais que não acreditam no cumprimento das metas por parte do governo nem na apregoada recuperação da economia portuguesa.
Na verdade, a pergunta que hoje se deve fazer é de que é que nos servem os cofres cheios que a ministra das Finanças se empenha tanto em exibir?
Tal como em 2011, esclarece--nos agora o primeiro-ministro, a Fitch, a Standard & Poor"s e a Moody"s não farão subir o rating da República antes das próximas legislativas. Mas para isso, está nas suas entrelinhas, é preciso que PSD e CDS voltem a ganhar as eleições.
Talvez fosse bom Passos Coelho telefonar ao oráculo Moedas para lhe perguntar se, tal como em 2011, os mercados estão eufóricos e expectantes por um novo programa de reformas que esta maioria, agora renovada, tem para apresentar. Ou se, pelo contrário, as agências de rating que em 2011 não acreditavam em José Sócrates e em Teixeira dos Santos não são afinal as mesmas que em 2015 não acreditam em Pedro Passos Coelho e em Paulo Portas.
NUNO SARAIVA
Hoje no DN

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