Declaração de interesses: fui convidada e nomeada para vários mandatos
dirigentes, sobretudo na CCDR-N, por membros dos governos do eng.° Guterres e
do eng.° José Sócrates. Para além de esses períodos se terem revelado uma
extraordinária experiência profissional, nenhum constrangimento sobreveio pelo
facto de as nomeações terem sido para cargos de confiança política.
Em nenhum momento me foi perguntado se pertencia a algum partido ou em
qual partido votava. Em nenhum momento sofri qualquer tipo de pressão ou
condicionamento sobre o meu modo de trabalhar e agir: intransigentemente
independente e técnico.
Dito isto, considero que está em curso, pela gestão integrada dos media
e da justiça, designadamente no processo movido ao eng.° José Sócrates, um
perigoso amedrontamento coletivo que nos tornará cidadãos mais fracos, mais
submissos e mais vulneráveis.
Qualquer cidadão que observe o desenrolar dos acontecimentos se vê
entrincheirado entre, por um lado, uma justiça que apenas comunica
generalidades sobre o processo, uma justiça, o que é pior, que teima em fechar
os olhos a sistemáticas fugas de informação sobre quem devia ter à sua sigilosa
guarda.
E, por outro lado, uma comunicação social que desinforma porque diz
tudo o quer, tantas vezes sem qualquer fidedignidade, queimando em praça
pública um dos pilares mais importantes de qualquer regime democrático: a
preservação de direitos, liberdades e garantias constitucionalmente protegidos
como sejam o direito ao bom nome e à presunção de inocência até trânsito em julgado.
Em conjunto, ambos os poderes quebram o seu contrato de confiança com
os cidadãos e fragilizam dia a dia a iniciativa dos portugueses, paulatinamente
amedrontados pelo cerco em que, finalmente, também cada um de nós pode ser
enredado. E à medida que o tempo passa, o tic-tac kafkiano tudo reduz a uma
névoa infinita. Seres humanos incluídos.
É que, aquilo a que todos temos acesso sobre as sucessivas decisões
judiciais, por exemplo no caso do eng.° Sócrates, não nos esclarece em nada, o
que não estaria mal de todo se não estivesse o arguido permanentemente sujeito
à apresentação, na generalidade dos media, de esquemas tortuosos,
incriminatórios, sem a mínima validação factual ou, o que é pior, alegadamente
provados por fuga de elementos do processo, o que é vergonhoso, antidemocrático
e anticonstitucional.
Afinal, sempre ouvi dizer que o direito penal é direito constitucional
aplicado e a Constituição protege o direito ao segredo de justiça e determina
que a lei estabelecerá garantias efetivas contra a obtenção e utilização
abusivas (...) de informações relativas às pessoas e famílias.
Podemos continuar assim, mas seremos todos mais fracos, mais submissos
e mais medrosos!
CRISTINA AZEVEDO
NO JN
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