É um dia como outro qualquer. Mas do que eu quero falar é do de 1964. Neste dia, como em todos os outros, estava a trabalhar na oficina do Neca “Papa”, na Cavada em Paços de Ferreira, junto a esta, havia outra que pertencia ao João “Russo”. Da parte da tarde começa-se a constar que o seu irmão tinha morrido num acidente de viação a caminho da Feira do Cô, - nesse dia comemorava-se ali uma feira/festa. Fernando “Russo” que é dele que se trata, deslocava-se para ali com a finalidade de conviver com os amigos, o que é apanágio de muitos que se deslocam para as festas para matar saudades, beber umas copadas de vinho, comer umas iscas de bacalhau e pôr a conversa em dia. Mal sabia ele o que lhe ia acontecer. Era um homem na casa dos trinta e poucos anos.
A notícia correu de boca em boca e toda a gente sentiu consternação pelo sucedido. Era uma pessoa relacionada com toda gente, era de Paços de Ferreira e tinha família em Freamunde - os seus sogros. Ainda estávamos incrédulos com a notícia quando outra surge. As sirenes dos carros dos bombeiros continuavam a tocar o que dava a entender que não era devido ao dito acidente.
Cada vez se ouvia mais sirenes com os toques infernais, algo de mal estava a acontecer. Como nestas situações depressa se vem a saber qual a causa, não demorou muito a constar que era um incêndio na fábrica “Grande” de Albino de Matos Pereira & Barros, em Freamunde, que tinha começado na secção de estofos. Esta secção foi a minha primeira escola profissional. Comecei a rever todos os cantos e quem ali laborava. Oxalá que nada de mal lhes tivesse acontecido.
Nessa altura trabalhava também na oficina do Neca “Papa” como polidor de móveis o José Maria Pinto Antunes, para os amigos o “Pranchadas” que era bombeiro da corporação de Freamunde. Como é lema dos bombeiros quando há um incêndio larga-se logo tudo o que se está a fazer para dar a colaboração necessária.
Foi o que aconteceu. O lugar da Cavada dista da fábrica “Grande” para cima de dois quilómetros e ele a correr a pé, nessa altura era a forma como se movimentavam os mais humildes. Quantas vezes vi o meu pai a correr como um desenfreado quando ouvia a sirene dos bombeiros. Eles conheciam o toque a desastre ou a incêndio.
Foi o que aconteceu. O lugar da Cavada dista da fábrica “Grande” para cima de dois quilómetros e ele a correr a pé, nessa altura era a forma como se movimentavam os mais humildes. Quantas vezes vi o meu pai a correr como um desenfreado quando ouvia a sirene dos bombeiros. Eles conheciam o toque a desastre ou a incêndio.
A maioria das corporações de bombeiros do distrito do Porto foram solicitadas para dar o seu contributo pois junto à fábrica havia umas bombas de gasolina e se o fogo se aproximasse era uma catástrofe de proporções incalculáveis. O trânsito ali foi cortado - a fábrica fica na berma da estrada nacional - e no centro da vila também.
Eu continuava a trabalhar, nesse tempo o trabalho era muito, quem dera aos industriais de hoje metade desse trabalho e o que relato foi-me contado pelo meu pai que ali trabalhava e alguns amigos. Foi uma catástrofe como relato em cima. Os funcionários previram o pior. Quando assim é vem logo o desemprego e não era como é hoje. Havia menos protecção social ou quase nenhuma. O meu pai anteviu logo dificuldades familiares. O cabeça de família desempregado causa transtorno. Mas a administração, os sócios gerentes e os empregados meteram mãos à obra e nada disso aconteceu. Em Freamunde é assim. Nada lhes mete medo e transformam o impossível em possível.
A fábrica foi remodelada. Mais tarde após a vinda do ultramar, em mil novecentos e setenta e três, fui novamente para ali trabalhar até mil novecentos e oitenta. Depois dei outro rumo à minha vida. Mas, relembro estes factos para dar conhecimento aos mais novos e vindouros.
Hoje a fábrica não labora. Fechou acerca de seis anos. Era a “Rainha” de todas as outras que existiam nas suas redondezas. Ali criaram-se grandes artistas que pelo tempo fora foram para outras onde o ordenado era maior mas a protecção social menor. Ainda hoje ouço alguns lamentarem-se de ganharam tão pouco de reforma. Os que foram reformados da fábrica “Grande” vieram com uma reforma razoável e no seu encerramento não ficou a dever um euro a nenhum seu funcionário. Mas este feito teve a mão de um grande homem que é: Teodoro Pereira.
Gosto de relatar estes factos e o dia 5 de Agosto de 1964 não podia passar despercebido. Foi um dia trágico.
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