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domingo, 15 de agosto de 2010

Transferência de Recluso:


O dia-a-dia continuava e num desses recebemos uma ordem da Direcção Geral para se transferir o recluso Alberto Ferreira (Berto Maluco) para o E. P. Coimbra. Quando lhe foi dito ficou aborrecido. Mas lá arrumou as suas coisas. Antes de partir fez ameaças ao Chefe Principal. Este recluso directamente com a vigilância não dava problemas, o que de outras formas as vinha a causar porque era um dos líderes, como que já referi.
Um domingo fui com a minha esposa ao NorteShoping a Matosinhos e encontro o Alberto Ferreira ali a passear. Desconfiei que estava em liberdade definitiva dada a tranquilidade como ali passeava. Quando se encontram em situação ilegal não demonstram tal à vontade. Ao outro dia dei conhecimento ao Chefe Principal para estar prevenido.
Passados uns meses fui com a minha esposa e os meus netos à praia de Lavadores, em Vila Nova de Gaia. Os meus netos foram brincar para o parque infantil quando me apercebo o mais novo vinha agarrado à mão de uma menina e uma senhora a acompanhá-los. Conheci a senhora. Era a companheira do Alberto Ferreira. Chamei o meu neto e quando reparo deparei-me com o Alberto Ferreira. Dirigi-me para a minha viatura para os meus netos lancharem e outra vez aparece o Alberto Ferreira. A sua viatura estava estacionada à beira da minha. Fui outra vez com os netos para o parque infantil e passado um pouco de tempo vejo o Alberto a insurgir-se contra uns sujeitos que iam dento de um BMW descapotável, a tirar fotografias, dizendo que não estava correcto tirar fotografias às crianças. Ainda olhou para mim a ver a minha reacção. Desconfiei. O motivo não era as crianças. Passados uns meses é assassinado como é do conhecimento público. Muitas vezes os Guardas Prisionais e outras forças de segurança são acusados de serem desconfiados, se olhamos para tudo com um olhar bastante observador, é derivado aos ossos do ofício.
Um dia foi-nos dito por um irmão de um recluso que não se apresentou de Saída Precária Prolongada, que todos os dias à noite, se deslocava para sua casa para ali pernoitar. Fui incumbido mais um Subchefe e um Guarda Motorista de nos deslocarmos à sua residência para o recapturar. O local da residência era o bairro de Santa Tecla em Braga. Estava combinado com esse irmão de nos auxiliar na recaptura - mas não queria ser visto - o que aconteceu.
 Quando chegamos à casa fomos recebidos pela esposa do mesmo que nos abriu a porta mas já tinha avisado o marido para fugir por uma janela. Depois de isto tudo jurei que nunca mais me metia em tal. Fomos rodeados por ciganos. Vi a nossa integridade física em perigo. Mais tarde tivemos conhecimento que tanto a P.S.P., como a Policia Judiciária, tinham sido alertados e nunca lá puseram os pés. Uns meses depois foi recapturado mas na rua.
O E. P. sofreu alterações na Administração. O Dr. Paulo de Carvalho foi transferido para o E. P. Porto (Custoias) e o Dr. Hernâni, que estava nesse E. P., veio para o de Paços de Ferreira. Foi uma premuta com prejuízo para nós. Logo a seguir abriu o E. P. Feminino de Santa Cruz do Bispo e quem o foi chefiar foi o Chefe de Guardas que estava a chefiar os Pavilhões Complementares, junto ao E. P. Paços de Ferreira, que abriu em 2003, sobre a sua autonomia.
É composto por três pavilhões. Cada pavilhão comporta cem reclusos. Volto a referir que não percebo a ideia de não ter a mesma tipologia da do E. P. Funchal. Os reclusos que eram transferidos para o E. P. Paços de Ferreira, depois de uma observação, se houvesse necessidade eram transferidos para os Pavilhões Complementares. No princípio havia uma selecção nos reclusos, que iam para ali transferidos, depois deixou de haver o que tornou estes pavilhões numa bandalheira. O pavilhão Nº. 3 recebia a maioria dos reclusos que beneficiam da flexibilidade das penas, assim como os que frequentavam cursos de formação. Os pavilhões nºs 1 e 2 os restantes reclusos.
Não compreendia porque não se fazia uma distinção e como prémio pelo seu comportamento, eram mudados de pavilhão para pavilhão, ou seja. Quando desse entrada, entrava no pavilhão Nº. 1, nessa altura via-se qual o melhor comportado nesse pavilhão, passava para o pavilhão Nº. 2 e assim sucessivamente. Parece que há interesse em fomentar o quanto pior melhor. Aqui com menos condições de segurança vinha parar tudo. Até se chegou ao cúmulo de reclusos que vinham de outros E. Ps, com medidas de segurança especiais, transferidos para o Pavilhão de Segurança criado para esse efeito - são dois, este e o do E. P. Monsanto - quando a Direcção Geral entendia que se devia tirar esse regime iam transferidos para os Pavilhões Complementares.
Cada pavilhão tinha um bar para reclusos, um recreio, um refeitório - a alimentação vinha do E. P. - uma sala oficinal, uma barbearia, um gabinete para atendimento da Técnica de Educação ou I.R.S., um gabinete de atendimento para os advogados, a escola era comum, uma enfermaria, quatro celas disciplinares, no pavilhão nº. 1, abdicou-se de quatro celas de habitação que passaram para cumprimento de sanções disciplinares - vinham reclusos dos outros pavilhões para esse efeito, quatro quartos para visitas íntimas, um parlatório para visitas. Havia todas as condições para se fazer um bom trabalho se houvesse perspicácia e vontade.
Os Pavilhões Complementares começaram a degradar-se chegando ao cúmulo, de os reclusos do E. P. Porto, quando eram punidos com cela disciplinar, virem cumprir aos Pavilhões Complementares esses castigos. Argumentava-se que as celas disciplinares estavam a sofrer beneficiações - fui aposentado em 2007 e os reclusos do E. P. Porto, ainda vinham ali cumprir as punições. O Director do E. P. Porto era o Dr. Paulo Carvalho, ex-Director do E. P. Paços de Ferreira e dos Pavilhões Complementares - aqui segue-se a máxima: quem parte e reparte e não fica com melhor parte ou é burro ou não tem arte. O Director do E. P. Paços de Ferreira, Dr. Hernâni, não tinha voto na matéria e éramos nós que sofríamos as consequências. O E. P. e os Pavilhões cada vez degradavam-se mais. A disciplina quase que não existia. Se não fosse o Chefe Principal opor-se entrava na anarquia como nos anos oitenta.
Um dia um recluso que beneficiava da flexibilidade da pena (Saídas Precárias e Regime Aberto Voltado para o Interior) por uso indevido do computador que existia na Biblioteca, onde o mesmo era faxina, passou a pronto do seu impedimento e resolveu querer complicações com a Direcção e Chefia. Fez um pedido para que lhe tirassem quatrocentas fotocópias de documentos seus, o que lhe foi indeferido. Em discordância com esta decisão resolveu entrar em greve de fome. Quando os reclusos entravam em greve de fome vinham cumprir essa greve às celas destinadas às sanções disciplinares, era essa determinação. Negou-se. Mas acabou por vir. Escreveu, para tudo que era sítio. Passado um dia, por volta das dezoito horas, a Subdirectora desloca-se aos Pavilhões Complementares e diz-me para fazer comparecer o recluso à sua Presença. Assim se fez. Passado uma hora a Subdirectora dá-me ordens que o recluso ia para o seu pavilhão e mandar-lhe o jantar que o mesmo terminava com a greve de fome.
Quando a Subdirectora se despediu de mim disse: não há aqui ninguém que resolva os problemas é preciso vir alguém para os resolver. Como me disse isto, perguntei-lhe qual foi a solução, dizendo-me vou dar autorização para lhe tirarem as fotocópias. Respondi-lhe: é assim que as coisas se resolvem! Para isso não era preciso deslocar-se aqui. Davam ordens e nós cumpríamos. Não ficou contente. Advertindo-me. Ao qual lhe voltei a responder. Doutora! Não lhe perguntei nada a Doutora é que se quis vangloriar.
Este mesmo recluso numa saída precária de curta duração, na sua apresentação, trazia objectos que eram proibidos. O guarda de serviço à Portaria não os deixou entrar fazendo um levantamento dos haveres apreendidos. No outro dia entregou-me a relação onde fiz uma informação ao Subdirector. Sobre o facto o Subdirector sabia que era um recluso que reclamava por tudo e para tudo levou ao conhecimento do Director, que pôs como despacho: não autorizo a entrada. Dê-se conhecimento ao recluso e que este avise os seus familiares para numa próxima visita fazer o seu levantamento. Não concordou. Fez uma queixa para o tribunal judicial de Paços de Ferreira, queixando-se que tinha sido feito refém, violação de correspondência e perseguição.
Foi chamado para prestar declarações o Director, Subdirector e eu. Quando fui ouvido a primeira coisa que o juiz me disse foi: tem conhecimento do motivo porque aqui foi chamado. Disse que sim. Vai ficar sujeito ao termo de identidade e residência. Aqui disse que não percebia o motivo do termo de identidade e residência, que cumpri com o estipulado no decreto-lei nº. 265/79, de 1 de Agosto, no que toca à entrada e saída de objectos.
Passados uns meses fui notificado que o meu procedimento foi dentro do estipulado na lei e que por esse motivo era dado como arquivado. Fui impedido de várias coisas. O recluso beneficiava de todas e mais alguma. Um dia escrevi ao juiz do T.E.P., era uma juíza, a contar-lhe a situação. Num conselho técnico para saídas precárias prolongadas, para Junho, concederam-lhe oito dias que é o máximo. Não fazia parte do conselho técnico - se fizesse mostrava a minha indignação - o Subdirector tinha conhecimento da carta que enviei e disse: Meritíssima, o Subchefe Pacheco, enviou uma carta para o T. E. P. relatando algo sobre este recluso e concede-se oito dias? Disse que realmente tinha recebido uma carta, já não se lembrava, por esse motivo se o Conselho Técnico fosse favorável retirava-se quatro dias. Assim aconteceu.
A seguir pediu uma saída de curta duração - há muito que beneficiava deste regime - nestes pedidos a chefia tem de pôr uns certos dados assim como o comportamento. Como houve a queixa para o tribunal, a greve de fome, tive de mencionar isto e dizer que a chefia da guarda entendia que não estava a ser merecedor mas deixava à consideração de Vexa -Vexa, era o Director. Uns dias antes da data que o recluso pedia para sair e o Director tinha de assinar para ser passada a respectiva guia que o acompanhava, recebo uma chamada pelo telefone interno, de uma funcionária da secção de reclusos a dizer que eu mencionava certas coisas e que o recluso não tinha punições se eu queria rever a minha posição. Respondi-lhe que o meu parecer estava escrito, legível e com a minha assinatura, era mencionado que deixava à consideração do Director. Esta chamada telefónica quase que podia apostar que estava a ser feita do gabinete do Director. Este não assumia os seus actos. Gostava de se dar bem com Deus e com o Diabo.
Continua

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