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domingo, 15 de agosto de 2010

De volta ao E.P. Paços de Ferreira:


Em dois mil e dois fui transferido para o E. P. Paços de Ferreira a meu pedido. Tinha que resolver a minha situação, como comprar apartamento, a idade ia avançando e ia fazer um pedido de empréstimo ao banco. Ao meu filho foi detectado as diabetes, passou a ser dependente da insulina. A minha esposa não podia se manter na Madeira com o meu filho neste estado, eu vinha constantemente ao Continente e esse dinheiro que gastava nas viagens dava para ajudar a pagar a prestação mensal. Por esse motivo pedi a transferência senão terminava ali a minha carreira. Um guarda que presta serviço nas cadeias do Continente, comparado com os que prestam nas duas cadeias da Madeira, devia de se aposentar mais cedo uns cinco anos, derivado a que no Continente há um maior gasto de energias.
O E. P. Paços de Ferreira era administrado pelo Dr. Paulo de Carvalho e chefiado pelo Chefe Principal, Barreira, conhecia ambos. Os Guardas eram os mesmos, não houve aposentações, transferências ou entradas. A população prisional tinha aumentado, entravam reclusos melhor preparados em tudo, a maioria era seguranças privados, treinavam em ginásios, eram corpulentos, continuaram a manter essa preparação no Ginásio do E. P.. Connosco não havia problemas a não ser coisas de rotina, constava-se que havia reclusos ameaçados mas estes não os denunciavam com receios de represálias.
Quando beneficiavam de saída precária eram assediados para no regresso trazer droga alguns reclusos não se apresentavam e quando recapturados alegavam ser esse o motivo mas não os denunciavam. Julgo que ser preso é um terror, entre eles há divisão e rivalidades, os mais aventureiros querem ser lideres, havia algumas lideranças, tentávamos sempre desmembrá-los mas havia alguns que só denunciavam se lhes desse protecção. Castigos havia alguns e quando isso acontecia iam cumpri-lo ao Pavilhão de Observação era por isso que existia.
O Refeitório era o local de maior aglomeração de reclusos, chegavam a juntarem-se aos quatrocentos, entre os que se encontravam a comer e os que estavam na fila de espera. Houve ocasiões de me encontrar só com um guarda para tantos reclusos. A maioria dos guardas de serviço apareciam ali só no final, avisei o Chefe de Guardas, mas as coisas continuavam. Tinha de abrir o refeitório se esperasse por ter guardas suficientes neste momento ainda esperava que tal acontecesse. Prevejo em alguns E. P. com este tipo de situação, um dia haver graves problemas. Tinha-se que controlar a maneira como ali se apresentavam, era proibido entrarem em chinelos, mangas cabeada, em pijama, de calções, fato de treino ou com a cabeça coberta. Tive de tomar posições ou pouco arriscadas, só me encontrava com um Guarda, tinha de ser e a disciplina era para se manter. Os restantes reclusos compreendiam e queriam que nesse lugar houvesse respeito que quando assim é ganham todos.
Numa visita de estudo ao Centro de Formação Profissional do Porto, custodiava reclusos que frequentavam o curso de Serralharia Mecânica, na partida intercedi que houvesse o máximo respeito. Chegados lá e quando fomos para almoçar vi coisas que não queria acreditar. Os formandos do Centro de Formação não respeitavam ninguém, comiam com as cabeças cobertas com bonés e capuz, era um barulho ensurdeçor. Próximo de mim encontrava-se um segurança privado e fiz-lhe a seguinte observação: isto acontece todos os dias. Ao que me respondeu que sim, que os professores deviam nas aulas ensinar-lhes os bons costumes. Se eu perguntasse o mesmo aos professores eles diziam que os seguranças privados deviam de ensinar as boas maneiras. Concluindo, ninguém quer tomar posições julgam que ganham o mesmo. Ganhar, ganham, perdem em autoridade e respeito.
No aspecto laboral há a Oficina de marcenaria, serralharia, havia vários cursos de formação; Serralharia Mecânica e Civil, Olaria, Electricista, Padeiro, Informática, Marcenaria, etc. No ensino desde o primário à Universidade, refiro isto porque há muita gente que desconhece o esforço que se faz para ter os reclusos ocupados. As cadeias deviam-se abrir mais à sociedade civil, embora hoje, note-se uma pequena abertura. A comunicação social anda ao sabor das notícias, se for notícias que vendem essas são noticiadas, se não for não interessa. Há dias vi uma notícia num jornal que agora não posso precisar que dizia que durante o semestre de 2009, tinha havido dezanove fugas não especificando que tipo de fugas. Para serem mais explícitos deviam dizer que entre essas estavam os não regressados de saída precária prolongada, autorizadas pelo Conselho Técnico, entre eles o juiz do T.E.P. E por falar em T.E.P., acho que os juízes deviam acreditar mais nos Conselhos Técnicos dos E. Ps., embora a última palavra seja sempre dele. Assim como ouvir os reclusos está consagrado em decreto-lei é raro serem ouvidos a não ser quando é apreciada a liberdade condicional. Acontece que é neste momento que o juiz fica a conhecer o recluso, só o conhece pelo processo, acho pouco para quem vai deliberar algo de importante para a vida futura de uma pessoa. O Sindicato Magistrados Ministério Público a isto não se refere, interessa-lhe o que lhe dá mais protagonismo, ouvir reclusos dá chatice. Em todos os E.Ps. há um livro para os reclusos se inscreverem e sempre que o juiz faz a visita mensal é obrigado a recebê-los - o que é raro. O sindicato que faça uma averiguação para se inteirar o que se passa como referi isto não dá protagonismo. Depois quem sofre são os guardas com os lamentos dos reclusos quando são só lamentos.
Continua

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