Vi um Calisto ao vivo na TVI.
Estava de barba e de gravata. Lembrei-me do Livro de Calisto e Melibea e da
puta velha Celestina, de Fernando de Rojas (1541), de onde retirei a imagem.
Calisto é definido no dicionário
como um indivíduo pequeno a cuja má sombra o jogador infeliz atribui a sua má
sorte. Este dá azar, como os calistos. Estamos como Calisto com uma puta velha,
a Celestina. Ventura, no caso.
O calisto mais calisto da
comunicação social portuguesa é Marques Mendes, seguido a pouca distância por
Nuno Rogeiro. Calistos de largo espetro. Falam de tudo, da economia ao
aeroespecial, das juntas de freguesia à estratégia das superpotências. Mas há
calistos em várias especialidades, fracionadas.
É necessário dizer umas patetices
no estúdio sobre economia liberal e o calisto de serviço é o César das Neves,
ou o Lourenço. Sobre uma versão reacionária da história sai a Fátima Bonifácio.
Se o assunto for ambiente sai um geota, Se for LGBT sai a Margarida Martins, se
for bombeiros sai o Marta Soares, se for sobre sexo e virtude sai o padre
Portocarrero, se for sobre futebol sai um estádio com coiratos e cachecóis. Se
for sobre proxenetismo e turismo sai o Zézé Camarinha.
Agora chegou um novo Calisto. Se
é sobre racismo e parvoíces, chama-se o Ventura. O Ventura é o Zézé Canarinha
do racismo. Com uma diferença: o Zézé Camarinha dava o corpo ao manifesto. O
Ventura aproveita o manifesto. O Ventura é o calisto de serviço para assuntos
tão velhos como a relação com o outro, o estranho, o estrangeiro. Ele é um
vídeo jogo da velha pornografia. Um jovem que julga ter descoberto a posição do
missionário. Há quem acredite nele.
Uma fação da opinião pública
considera que chamar o Ventura para falar sobre racismo, fim do Serviço
Nacional de Saúde, do sistema de previdência social, das reformas e do perigo
dos pretos e dos ciganos tomarem o poder em Portugal é dar tempo de antena a
uma bosta falante, é reconhecer a sua condição de ser da nossa espécie, de
nosso semelhante. E isso, dizem-nos, é mau.
Há a outra face da moeda, o Ventura,
ao aceitar ser o calisto que é chamado para dar o focinho pelas causas do
racismo que o Darwin resolveu, da terra quadrada, das maldades intrínsecas dos
habitantes das Ilhas do Porto ou dos Bairros periféricos de Lisboa, ao defender
que é à marrada que se resolvem problemas milenares de integração de minorias
nas sociedades dominantes está a fazer do calisto. Isto é, do bufão que o
senhor chama para dizer umas piadolas no final dos banquetes: “Ó Ventura, ladra
lá aí sobre o que sabes sobre pretos porque os outros animais que andam por
aqui aos restos não têm o teu descaramento e não se vendem tão barato como tu!”
E o Ventura ladra.
Isto é, o Ventura, ao aceitar ir
representar o papel do racista de serviço às TVs está a assumir o papel da
rameira sempre disponível e a baixo custo.
Esta atitude de disponibilidade
do Ventura a troco de exposição tem uma virtude: os seus clientes correm o
risco da sífilis e das blenorragias, os antigos esquentamentos e isso é bom: os
venturosos do Chega são esquentados!
Isto é, o Ventura, ao aceitar o
papel que lhe destinaram, de calisto às ordens como racista, aceita ser uma
doença venérea. Trata-se com creolina, com borato, com senso.
Sem comentários:
Enviar um comentário