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quarta-feira, 8 de janeiro de 2020

Trump, um talibã na Casa Branca:


Valupi, porque não perguntar que legitimidade tem o presidente de um país, mesmo do mais poderoso do mundo, de, por sua vontade e iniciativa, mandar matar quem quer que seja, do seu ou de outro país? Julgo que nenhuma. Mas aconteceu este mês, e todos os dirigentes políticos de todos os países, que eu saiba, perante tal acto, ou fizeram declarações de circunstância, ou assobiaram para o ar, ou encolheram os ombros. Nenhum o classificou de assassinato. E foi um assassinato confesso, transmitido nas redes sociais. O que era ou quem era vítima não justifica a prepotência do acto. O que é e quem é o autor do acto explica o medo dos responsáveis políticos.


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Concordo com o nosso amigo Manojas e recomendo o consumo de How To Avoid Swallowing War Propaganda + Soleimani attack: What does international law say? 
Porém, contudo e todavia, muito acima dessa absolutamente legítima e altamente relevante problemática dos assassinatos por ordem estatal (de que Obama usufruiu, por exemplo, ao arrepio do Estado de direito ou nas suas zonas cinzentas e esconsas) coloco as declarações de Trump, via Twitter, onde ameaça destruir monumentos e locais de valor cultural no Irão.

Começando pelo que vem primeiro: destruir a cultura, qualquer cultura, qualquer manifestação de cultura, é destruir parte da civilização, tentar destruir a humanidade. Foi esse sentimento de horror que, recentemente em termos históricos, sentimos quando os talibãs destruíram os Budas de Bamiyan no Afeganistão, em 2001, e quando o “Estado Islâmico” destruiu não se sabe quantos objectos de valor histórico no Iraque e na Síria, entre 2006 e 2017 (e voltará a destruir e saquear em qualquer oportunidade futura que se apresente aos que continuarem a usar essa bandeira).

É o mesmo sentimento de horror que se pode sentir ao descobrir como o cristianismo e a cristandade causaram a destruição e desaparecimento de inúmeros objectos, incontáveis memórias e saberes, que foram sendo criados e desenvolvidos ao longo de milhares de anos em vários continentes. O mesmo desespero, quase raiva num outrora agora, que se abate sobre quem ainda sonha com os tesouros da Biblioteca de Alexandria devorados pelo fogo.

E passando logo para o que fica a marcar o século, a presidência de Trump não tem paralelo com nenhuma outra anterior até onde a memória e o estudo alcançam. A sua eleição estabeleceu um novo paradigma eleitoral em que os critérios analíticos até então vigentes na ciência política e no comentário jornalístico implodiram ou foram terraplanados. Para a minha ignorância e para muito boa gente com reputação internacional como especialista nas cenas, ter assistido à sua achincalhação de John McCain, um herói de guerra norte-americano consensual e símbolo máximo dos valores republicanos tradicionais enquanto Trump fugiu do serviço militar por ser rico e por ser cobarde, levou-me a ter a crença inabalável de que o ataque ad hominem, só por isso entre o tanto que parecia eleitoralmente suicida, chegaria para o impedir de ganhar sequer a nomeação pelo Partido Republicano, quanto mais a nação americana. Tanto para aprender sobre a natureza humana, portanto.

Uma das mais sólidas democracias planetárias está sob uma inaudita ameaça. Se os generais norte-americanos cumprirem uma ordem presidencial para a destruição intencional de um objecto ou local com valor cultural isso será equivalente, no plano da lógica, ao Holocausto. Não temos outro comparativo. Corresponderia à falência dos EUA como país defensor desse povo inscrito na abertura da sua Constituição. E, a ocorrer, tal não significaria que o problema estava na ideia de democracia e respectivos ideais democráticos perfilhados desde 1789, o problema voltaria a ser constitucional. Seria necessário introduzir mais uma emenda, desta vez a exigir um exame étnico a todos os candidatos presidenciais de forma a impedir que se volte a ter um talibã na Casa Branca.


Do blogue Aspirina B

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