Nas últimas semanas a revisão da lei sobre o financiamento dos partidos
serviu para uma lamentável campanha populista, que teve em Cristas e nalguns
media, o seu veículo de bombardeamento demagógico. Sobre ela disseram-se
mentiras e fizeram-se processos de intenção, que visaram desprestigiar os
políticos em geral pretendendo-se, sobretudo, prejudicar os partidos mais à
esquerda, sobretudo o PCP impedido de recolher receita com a Festa do Avante e
o PS cuja situação financeira é, há uns anos, problemática e depende muito da
forma como é resolvida a questão do IVA. Porque, para quem tanto se
escandalizou com a suposta devolução desse imposto aos partidos, que
desenvolvem atividade política, não existem os mesmos pruridos com a Igreja
Católica que, apesar da laicidade do Estado, continua a usufruir de privilégios
incompreensíveis a nível fiscal.
Poucos alertaram, igualmente, para a tremenda lata de Cristas,
apresentando-se como escandalizada virgem isenta de pecado mas cujo partido
vive quase exclusivamente do financiamento dos contribuintes e ocupa uma sede
pela qual nem paga renda ao Patriarcado, nem este gasta o que quer que seja com
o IMI de tão relevante espaço.
E Marcelo que, por uma vez, tinha a possibilidade de ser bem mais do
que Marcelo, exercendo uma pedagogia capaz de devolver a questão ao que a ela
diz respeito, acabou por reconhecer nada haver de inconstitucional na lei, mas
decidiu-se a vetá-la por considerar-se assim consonante com a escandalizada
indignação dos demagogos.
Fico por isso muito satisfeito por ver o Partido Socialista submeter
novamente o diploma à Assembleia não lhe alterando sequer uma vírgula. Nesse
sentido porta-se com bastante mais inteligência do que o Bloco de Esquerda, uma
vez mais na lógica de uma imaturidade política, que parece custar-lhe a
superar. Porque tratando-se de uma legislação que, já na altura em que fora
revista anteriormente, não disfarçava a intenção de prejudicar o PCP, não
merece que seja tida como contestável por outras forças políticas, que não as
das direitas, as principais interessadas em mantê-la tal qual está.
Será interessante constatar a a reação do PSD, agora liderado por Rui
Rio, perante um diploma, que os seus próprios deputados votaram favoravelmente
no mês passado. Mantém a coerência do seu juízo ou rendem-se á demagogia de
Cristas e da imprensa tabloide (que é quase toda a que se publica entre nós)? E
sentirá Marcelo vontade de confrontar novamente a maioria parlamentar e a
própria vontade do Tribunal Constitucional, que emitiu a sua própria reação
positiva sobre o seu conteúdo? Ou reconhece que tomar partido pela minoria
parlamentar também implica violar o seu dever de respeito pela regra da
separação de poderes, em que se conjugam dois deles - o Legislativo e o
Judicial - para ver a lei alterada de acordo com o que ficou decidido em tal
votação?
Publicada por jorge rocha
Do blogue (Ventos Semeados)
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