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quarta-feira, 18 de março de 2015

O FMI diz, sem se rir, que o ajustamento falhou:

O Fundo Monetário Internacional está contra o dr. Passos Coelho, o dr. Vítor Gaspar e a dra. Maria Luís Albuquerque. Agora vem dizer que o programa de ajustamento português falhou. Não se faz. Depois de três anos de tanta dedicação à troika por parte do Governo, esta ingratidão por parte dos técnicos do Fundo até dói.
Explico-me, até porque o FMI não diz isto assim da boca para fora e preto no branco. Dá umas voltas para lá chegar. Em termos singelos, qual era a estratégia do ajustamento? Pois cortar violentamente as despesas do Estado (2/3 do ajustamento decorreriam disso), aumentar impostos (1/3), privatizar tudo o que fosse possível, cortar salários e pensões e precarizar as relações laborais. Tudo isto seria suficiente para Portugal reganhar de novo a confiança dos investidores internacionais. E a economia nacional passaria a registar fortes níveis de crescimento depois de passar por esta purga, que decorreriam em grande parte do regresso em força do investimento, sobretudo estrangeiro.
O dr. Passos acreditou. O dr. Gaspar acreditou. A dra. Maria Luís acreditou. E agiram em conformidade, tornando-se mais papistas que o Papa. Fizeram questão de dizer que não só fariam o que lhes mandavam como fariam mais. E fizeram. Atiraram-se aos assinalados males da economia da economia portuguesa como gato a bofe. E a economia devia recomeçar a crescer, lampeira e ágil, dois anos depois. Vá lá, três anos. Ok, quatro anos. Bem, cinco anos. Este ano já vamos crescer 2%, diz o Prof. Cavaco. Não chega? É ou não a prova que o ajustamento resultou?
Pois bem, em primeiro lugar o ajustamento foi conseguido muito mais pelo lado do aumento dos impostos do que pelo corte das despesas, que foram, aliás, sistematicamente anunciados como temporários, pelo que terão de ser repostos. Mas para lá disso, o gatilho que nos colocaria de novo a crescer rapidamente seria o investimento. Ora então façamos contas: o investimento caiu quase 40% entre 2007 e 2013, devendo recuperar apenas 7% a 8% entre 2013 e 2015. O seu peso no PIB passou de 22% para 15% – FMI dixit.
Também há aquela história do cavalo do inglês, que quando estava a trabalhar quase sem comer nada morreu. Mas isso agora não interessa nada, como diria aquela senhora da televisão.
De acordo com estimativas da Comissão Europeia, o nível de investimento previsto para Portugal em 2015 estará ainda a 70% do registado em 2007, onde foi atingido um pico. É um dos piores resultados da zona euro. Atrás de nós só ficam a Grécia (outro país onde o programa de ajustamento foi um «sucesso») e Chipre (que também foi «ajustado»). A cereja amarga em cima do bolo é que, segundo previsões do FMI, no período 1999-2019, Portugal terá o quinto crescimento mais lento do mundo, 0,9% em média anual.
Tudo visto e revisto, o programa de ajustamento , apesar de todas as malfeitorias que foram feitas contra o Estado social e contra os salários e direitos dos trabalhadores, embaratecendo brutalmente a mão-de-obra portuguesa, não teve como resultado captar somas consideráveis de investimento estrangeiro para Portugal. O que veio comprou empresas que já existiam, sobretudo aquelas que dão rendas garantidas e não criou mais emprego. Pelo contrário, vai
criar mais desemprego. E a propalada maior eficiência, que conduziria à descida dos preços, não aconteceu. Ou melhor, verificou-se o contrário, nas tarifas da EDP, nas taxas aeroportuárias da Vinci, etc.
Conclusão: o programa de ajustamento foi quase quase um sucesso. Só faltou o investimento, que era a pedra de toque para sairmos rapidamente do buraco onde caímos. Não chegou nem vai chegar tão cedo. Pelos vistos, é necessário continuar a diminuir salários e a precarizar ainda mais os contratos de trabalho, acabando também com a contratação coletiva, para se verificar então o sucesso absoluto. Nessa altura é que vão chover milhões sobre Portugal. Também há aquela história do cavalo do inglês, que quando estava a trabalhar quase sem comer nada morreu. Mas isso agora não interessa nada, como diria aquela senhora da televisão.
(Nicolau Santos, Expresso Diário)

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