Paulo Portas chegou, falou e disse: "Os pobres não se manifestam,
nem vão à televisão." Por antinomia, deduz-se que quis afirmar: quem se
manifesta são os ricos, assim como são eles que vão à televisão. Como sabemos
que o presidente do CDS-PP não é tolo inclinamo-nos para a triste e dura
hipótese de que ensandeceu. A verdade é que não tem andado bem: os direitos, os
deveres e as características de quem governa têm sido espezinhados, com
faustosa leviandade.
Ele, eles não sabem o que fazem. E a proibição de a CGTP organizar a
manifestação na Ponte 25 de Abril, sob a alegação dos perigos a haver foi o
absurdo dos absurdos. O processo intentado contra os valores que definem a
democracia tem sido contornado com maior ou menor êxito. E o caso da Ponte 25
de Abril demonstrou que a imaginação possui uma força que o poder
permanentemente ignora. A desorientação dos habituais panegiristas do Governo,
que procuraram minimizar a importância do acontecimento não obstou a que ele
tivesse a monta desejada. O Marcelo chegou a ser grotesco; Marques Mendes,
coitado!, exteriorizou a habitual pungente mediocridade; Sarmento conseguiu
fazer-nos entediar mais do que costuma, levando-nos, de novo, a perguntar o que
faz ali a funesta criatura.
Luís Delgado salvou a honra do convento, criticando a decisão eruptiva
do Executivo com a veemência de quem condena uma indesmentível burrice. Depois,
surgiu o Portas, com o brilho fanado pelas "incongruências
problemáticas" de um homem ferrado pelas irresoluções de carácter. Não compreende,
ou faz por isso, que a pequenina ascensão do CDS resulta da queda do seu
parceiro de coligação. No meio desta baderna, entre a asnada, a incompetência,
a sobranceria desesperada dos que naufragam, o dr. Cavaco, no estrangeiro,
assevera que não vai levantar pendências ao Tribunal Constitucional sobre as
evidentes inconstitucionalidades do Orçamento.
Claro que todos estes incidentes são sintomas do mal-estar da sociedade
portuguesa, e da degradação da democracia, em que o sentido da dignidade é
amiúde mortificado pela "indiferença actuante" de um Presidente da
República que o não sabe ser, fazendo pender o prato da balança para um só
lado.
Sabe-se que a política, lato senso, foi substituída pela
"gestão" e esta comandada pela finança e pelos interesses de grupo. É
total o contraste entre a exigência de justiça e de equidade social e a
evidência falsa e inútil do discurso dos dirigentes. Há poucas vozes
protestatárias na imprensa e a grande rábula da "independência" e da
"imparcialidade" ficou amplamente comprovada, como rábula e ardil,
naquele abjecto programa na RTP, no qual o Passos Coelho "respondeu"
ao País, sem responder a nada.
Como disse um teólogo, "vivemos mergulhados no mal da alma",
e se a pátria tem passado por interregnos terríveis, sempre surgia uma luz, que
nos conferia esperança. Agora, é isto.
BAPTISTA BASTOS
Hoje no DN
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