Afirmo-o com toda a certeza. Fui
ao Calendário de mil novecentos e quarenta e seis para me inteirar do que
afirmo. O motivo foi o seguinte: no dia quatro de Agosto desse ano os meus pais
contraíram matrimónio. Como naquele tempo trabalhava-se de segunda-feira a
sábado o casamento dos meus pais tinha que ser a um domingo.
Se casar, para quem tinha fracos
recursos, já se tornava numa aventura se fosse num dia de trabalho era-o mais
porque naquele tempo não se podia prescindir de um dia de trabalho.
A Segunda Grande Guerra Mundial tinha acabado há meses. O Mundo passava por uma grande crise. Assim todo o tempo de trabalho era preciso para fazer face à vida. Por isso o meu rebuscar no calendário de mil novecentos e quarenta e seis que dia de semana tinha sido o quatro de Agosto desse ano.
Nesta foto falto eu e a minha irmã mais velha
Se meus pais fossem vivos, eu e
os meus irmãos, estávamos a fazer-lhes uma singela festa de homenagem. Não
sendo possível faço-o aqui.
Não sei se os meus irmãos estão
de acordo - julgo que a maioria está, mas…, entre os outros nove, pode haver
uma ovelha ranhosa - como o blogue é meu, assim como o tempo gasto neste texto,
aproveito para falar um pouco deles.
Como disse casaram numa época difícil.
Mas se não o fizessem, nunca o fariam, porque esses anos foram difíceis durante
uma eternidade. Só a partir da década de sessenta é que as coisas começaram a
não ser tanto. Não porque o País sofresse uma renovação. Mas por força da
emigração e da guerrilha ultramarina.
Começou a haver falta de
mão-de-obra derivado à emigração e aos muitos jovens que foram combater para
África em “defesa da Pátria”. O meu pai nessa época já ultrapassava a idade do
serviço militar obrigatório vigente e não tinha espírito aventureiro de
emigrar. Era muito agarrado à terra assim como minha mãe.
A única vez que foram viver para
fora de Freamunde tinha eu dois anos. Fomos morar para S. Mamede de Negrelos,
já ali morava uma minha tia, irmã da minha mãe, e os meus pais para ali foram
em busca de uma melhor vida. Não emigraram, mas sim imigraram.
Só que essa imigração durou cerca
de uns três anos. O não ouvir o sino da terra levou a que as saudades se
tornassem cada vez mais sentidas e para isso só restou uma solução: o regresso
à terra. E, assim fizeram.
Em Junho de mil novecentos e
cinquenta e quatro viemos residir para o lugar da Bouça em Freamunde. O meu pai
voltou para a fábrica de móveis de Albino de Matos Pereira & Barros como
serralheiro civil.
As dificuldades continuaram assim
como os filhos continuaram a nascer à média de um por cada dois anos. Até que
se chegou à linda conta de dez. Não foram mais talvez porque a fábrica esgotou
a matéria-prima.
Pelo meio tinha falecido uma de
tenra idade. Naquela altura a meningite levou uma série de crianças. Também o
Serviço Nacional de Saúde não existia. O que leva hoje a que sejamos dos países
com menos mortes infantis.
Hoje dá-me para recordar os meus
pais e transcrever estas recordações em texto. Entendo que merecem esta minha recordação.
Fomos uma família pobre, mas rica no que concerne à união de família. Todos
lutávamos para que a família cada vez fosse mais unida. Dificuldades havia-as a
toda a hora.
Mas nunca fomos como os
pobrezinhos das tias de Lobo Antunes e nem de brincar aos pobrezinhos de
Cristina Espírito Santo. Éramos uma família pobre, mas não uma pobre família.
E, assim hoje recordo o dia em
que meu pai e minha mãe deram o sim. E foi o sim até que a morte os levasse.
Não é como hoje que à mínima
crise conjugal vão logo para o divórcio. Não! Muita tempestade houve mas a nau
conseguiu equilibrar-se sempre.


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