Sou dos raros jornalistas que não disseram na semana passada: "Uma
coisa é certa, Portas não pode voltar atrás." Aqui entre nós, a palavra
"irrevogável" também me fez supor que ele não voltaria atrás. Mas
como estive de férias, safei-me do embaraço público e geral dos meus colegas.
Forte desse meu involuntário sucesso, permito-me dar uma lição: na política
portuguesa, nunca se diga "não pode". Pode, tudo pode. Em Portugal,
Cavaco pode ser Presidente, Passos pode ser primeiro-ministro e Seguro pode ser
chefe da oposição. Se isso pode, como não aceitar as mais loucas bizarrias? Até
digo mais, essa tempestade perfeita - Cavaco, Presidente, Passos,
primeiro-ministro e Seguro, chefe da oposição - não só permite como torna
desejável que os políticos portugueses se contradigam e façam o irrevogável
vogar para o ponto de partida. Há nisso esbracejar, grito sôfrego, vontade de
fugir do marasmo. Tudo melhor do que a angústia de termos Cavaco, Presidente,
Passos, primeiro-ministro e Seguro, chefe da oposição. À falta de soluções
sólidas, venham, ao menos, essas pequenas provas de vida. Olhem como a simples
contradição de Paulo Portas nos levou a um governo um poucochinho melhor do que
o anterior... "Levou a..."?! Então já é definitivo, Cavaco aceitou
essa solução? Claro que já. Era justamente isso que eu vos estava a dizer. Ele
é nada, um dos três nadas deste país. As hesitações que finge são só para o
autorretrato com que se ilude.
FERREIRA FERNANDES Hoje no DN

Sem comentários:
Enviar um comentário