Hoje ao dar uma volta pelo centro de Freamunde lembrou-me do título que
dou a este texto e resolvi passar da frase ao acto. Vi o afinco com que
desmontam o que há dias montaram. E lembrou-me de dar vida - “personificação” -
aos vários seres mortos que contribuíram para engrandecer as festas Sebastianas
e Freamunde. Sim! Nestes dias Freamunde vestiu as suas melhores roupas para receber
os milhares e milhares de Freamundenses e forasteiros.
Quando aqui chegaram vi a alegria estampada no “rosto” por serem os
escolhidos para iluminar durante dez dias as Sebastianas. Estou-me a referir
aos arcos e suas minúsculas lâmpadas, aos holofotes que davam cor às torres da
Igreja Matriz e Capela de S. Francisco - não compreendo porque não se faz o
mesmo à de S. António - e as várias barracas de diversão.
E quem não se sentia orgulhoso e vaidoso por tal escolha! São umas
festas mundialmente conhecidas e vividas até à exaustão. Quem não se sentia
orgulhoso e vaidoso por ver tantos olhos a admirá-los! Embora também saibam que
há um ou outro critico a dizer mal. Seja pelo efeito de ramada usada este ano,
pela cor das lâmpadas, ou até, por não terem posto nos arcos da rua do Comércio
a imagem do Mártir S. Sebastião como vinha sendo normal.
Mas de uma ou outra forma via-se que estavam contentes. E às horas
certas lá se acendiam e aí o brilho era maior e até havia inveja pelos efeitos
que causavam chegando ao ponto de entrarem em diálogo. Diziam os holofotes para
as lâmpadas e arcos:
- Estão roídas de inveja por não estarem a iluminar a casa que dá
guarida a S. Sebastião. Sabeis que como fortes que somos com a nossa luz só nós
é que podíamos ser os escolhidos!
- E que nos importa - responderam as lâmpadas e os arcos. Inveja tem vocês por estarem longe do arraial. Não podem admirar as várias criaturas que passeiam debaixo dos nossos olhares; jovens, idosos, do sexo feminino e masculino, sendo que os mais novos de tanto gostarem de nós não nos querem abandonar. É a noite inteira. Nunca vimos coisa assim!
- E que nos importa - responderam as lâmpadas e os arcos. Inveja tem vocês por estarem longe do arraial. Não podem admirar as várias criaturas que passeiam debaixo dos nossos olhares; jovens, idosos, do sexo feminino e masculino, sendo que os mais novos de tanto gostarem de nós não nos querem abandonar. É a noite inteira. Nunca vimos coisa assim!
- Olha, olha! - Responderam os holofotes. Debaixo dos nossos olhares as
pessoas que ali vão, vão mais compostas e não fazem barulho como o que fazem lá
para os vossos lados. Aqui temos horas de sossego, embora continuemos a dar
luz, porque não queremos abandonar o S. Sebastião e o povo de Freamunde. Por
falar nisso já repararam o bairrismo com que abrilhantam estas festas!
- É verdade - anuíram os arcos e
as lâmpadas. Temos andado por várias terras e nunca vimos coisa igual! Desde o
estar acesas até raiar do dia e, julgo por vontade de muitos, até queriam que
estivéssemos assim durante o dia.
- Já vos estais a gabar - responderam os holofotes. Como se fossem
realmente fortes! Quem dava por vós acesas durante o dia? Ainda se fossem
potentes como nós. E… estamos num patamar mais alto que o vosso. Por isso éramos nós que nos devíamos gabar. As pessoas fartam-se de dizer que foi boa ideia,
pôr-nos ali. Antes a vossa luz era fraca. Pessoa que deixasse cair uma moeda ao
chão nunca mais a encontrava. Ao contrário, nós alumiamos tudo. E repara como é
azul o nossa cor! Até ouvimos uns senhores comentar que assim é que está bem.
Que diz com a cor desta terra. Azul! Que o amarelo com que vós tendes nas
vossas lâmpadas são cores da fome e peste.
- E nada mais a condizer - responderam em uníssono os arcos e lâmpadas.
Lemos num panfleto, caído no chão, que o Mártir S. Sebastião era devoto da
fome, peste e também da guerra. Por isso nada mais em concordância com a nossa
cor.
- Olha que não - responderam os holofotes. Pelo que foi dado ouvir esta
gente não gosta mesmo do amarelo. Dizem que o amarelo só serve para atrasar.
Não vês o que acontece quando nos aproximamos de um semáforo. O amarelo
manda-nos abrandar. E este povo é dotado para ir sempre em frente. Se assim não
fosse não faziam festas como estas e olha que quem o diz está farto de andar
por onde se realizam! Só comparado a nós as barracas de diversão. E pelo que
nos é dado observar aqui nestas festas não têm sossego.
- Concordamos convosco - responderam os arcos e as lâmpadas. Não vale nada haver contradições. Todos fazemos parte desta festa. Para o bem e para o mal.
Mais o outro que este último. Só nos dá pena é o dia que nos vão desmontar. Não
sabemos para onde vamos e como vamos ser tratados.
- É verdade - disseram os holofotes. E nós não sabemos se vamos ser
utilizados. Talvez vamos ser remetidos às prateleiras das arrecadações e só para o ano é que vamos ser novamente utilizados e aqui em Freamunde!
- Se é que fazem a festa - arremataram os arcos e lâmpadas. Da maneira
que há crise não sabemos qual o nosso futuro. Embora nos fosse dado ver ontem a
nova Comissão a pedir uma moeda de um euro para fazer face a qualquer evento
para as Sebastianas de dois mil e catorze. E só por isso é que nos leva a crer
que para o ano vai haver festa ao Mártir S. Sebastião. Mas… certeza, certeza,
não temos.
- Podeis crer… podeis crer - disseram os holofotes. Esta gente não olha
à crise. Fazem os possíveis e impossíveis para lhes dar sempre continuidade. E
olhai que estou informado, embora caloiro, do sentir desta gente. Estas festas
vêm de tempos imemoriais e só tiveram um interregno, desavenças com o Bispo do
Porto, por causa da celebração profana. Queria só remeter esta gente para a
igreja. Preferiram não as fazer durante uns anos que se remeterem aos caprichos do Bispo.
- Podia lá ser - arremataram os arcos e lâmpadas. Da maneira que vemos
são pessoas de muitos folguedos. Aqui não se vê grande burguesia. Tudo é igual.
Todos vibram. É como dissemos. Nunca vimos coisa assim. Só nos dá pena é elas
acabarem.
- É verdade… é verdade - concluíram os holofotes. O que se inicia
também finda.

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