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quarta-feira, 16 de maio de 2012

A Fábrica Grande:

Com este título a maioria dos jovens de Freamunde não sabem a que fábrica me refiro. A “Fábrica Grande”, conhecida como a rainha de todas as que existiam no concelho de Paços de Ferreira, situava-se na rua do Comércio, única rua existente «as restantes eram conhecidos por lugares» em Freamunde na década de sessenta, e com o nome industrial: Albino de Matos Pereira & Barros Lda.
Para muitos dos jovens saídos da escola primária, - quarta classe – era o seu liceu e mais tarde a sua universidade. Sim, naquele tempo, passados dias o destino dos jovens providos de famílias de fracos recursos, tinham as fábricas de móveis, metalomecânicas e têxteis, alguns, «poucos» enveredavam pela construção civil: pedreiros, trolhas, um ou outro na agricultura, como seu futuro.
Ser operário era o objectivo de qualquer ser humano para fazer face à vida. A construção civil era vista como uma profissão de recurso, derivado ao seu esforço físico, os jovens com dez, onze anos, geralmente não tinham arcaboiço para tão dura tarefa. Da agricultura fugiam como o diabo foge da cruz, porque era uma profissão em que se tinha de trabalhar de segunda-feira a domingo e regra geral não recebiam a “féria”, de quinze em quinze, como era habitual nas outras profissões. Por isso procuravam trabalho nas fábricas de móveis, depois do horário laboral, ajudavam os seus pais nas lides da lavoura, tornando-se assim um pouco independentes pelo motivo de auferir um ordenado.     
Também fui contemplado com esta sina. Depois de fazer o exame da quarta classe, onze de Julho de mil novecentos e sessenta, uma segunda-feira, por casualidade, segunda-feira de festas da Vila, passados oito dias - aqui tive o prémio dos meus pais, oito dias de férias – no dia dezoito de Julho desse ano começou a minha actividade profissional. Era um puto como se usa dizer.
Nesse dia, logo de manhã, saí de casa acompanhado pelo meu pai para dar início ao primeiro dia de trabalho. Esperei que o senhor Abílio Barros, sócio gerente, chegasse para determinar qual a profissão que me ia dar. Derivado a ser franzino, julgo eu, levou-me à secção de estofos para ali aprender a arte de estofador. Não era usual proceder assim com os jovens mas comigo isso aconteceu. Julgo por ser filho de uma sua antiga criada de servir. Tal como eu, a minha mãe, quando saiu da escola primária foi para criada de servir para casa do senhor Abílio Barros e só saiu dali para o casamento. Julgo ser por isso que, toda a consideração e estima por mim, resultasse disso.

A minha mãe é a primeira da direita
Fui apresentado e entregue às ordens do senhor Manuel “Mibique”, encarregado da secção de estofos. Ali trabalhavam várias pessoas que por consideração e carinho ainda as recordo, umas já falecidas, aliás a maioria, só dois é que estão entre nós: Manuel “Mibique” e Adão “Lavrador.
O meu pai também ali laborava. A partir daí, eu era, seu companheiro inseparável, principalmente na ida. Na vinda isso não acontecia. O meu pai demorava a sair da fábrica, era serralheiro civil, e para se aprontar – lavagem das mãos - algumas vezes vi como o fazia para tirar o óleo, esfregavam-nas com água e serrim até o óleo desaparecer o que demorava algum tempo. Esse tempo era por mim aproveitado para chegar ao campo da feira, com o mesmo nome de lugar, para um jogo de futebol com outros miúdos.
A “Fábrica Grande” produzia de tudo. Desde móveis escolares, em madeira e ferro, toda a espécie de mobílias para lares. Tinha secções para a laboração de tudo só não tinha máquina de fazer dinheiro: polimento, marcenaria, carpintaria, talha, serralharia, estofadores, maquinaria, pintura, cromagem, serração de madeiras, estufa de madeiras, loja de ferragens e louças, vidraria, cantina com refeitório, secção de moagem de grão e bombas de gasolina.
Hoje a “rainha” de todas as fábricas não existe. Dá pena. Quando ali passo recordo os dias ali passados. Como as Universidades formam pessoas para a vida, a Fábrica Grande, também formou centenas e centenas de indivíduos.

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