(Por José Gabriel, in Facebook, 20/01/2025)
Hoje, a propósito dos festejos de Trump, os painéis televisivos de comentário político pareceram transformar-se em gabinetes de psicopatologia. Sobre o presidente norte-americano eleito, todos – com raras e honrosas exceções – pareciam querer produzir diagnóstico. Quer dizer: a análise política esperada transformou-se num festival de psicologismo mal-amanhado. Nem o Pacheco Pereira resistiu a tentar ensaiar um diagnóstico de narcisismo patológico. Isto pode ter uma breve piada, mas não vale um caracol. Por ser conversa de diletantes, por ser irrelevante, por haver – hoje! – assuntos na agenda internacional que pediam um debate sério, mesmo que só em torno das possíveis ou actuais posições de Trump sobre elas.
Tomemos o óbvio exemplo de hoje, a propósito da importantíssima questão do cessar-fogo em Gaza. Estavam Netanyahu e Biden a fazer, desde Maio, o intragável bailinho habitual sobre o tema: – “Então, queres o cessar-fogo? Eu não, quero o cessar-fogo! Ah, bom, julgava que querias o cessar-fogo…” -, evitando, sob todos os pretextos implementar no terreno o plano traçado e alegadamente acordado, como já era, mais uma vez, óbvio nestes últimos dias – e não sejamos ingénuos pensando que era só Netanyahu a arranjar estes pretextos para este adiamento -, quando Trump, com a subtileza que o caracteriza, enviou um emissário, Steve Witkoff. Depois de falar com o governante israelita e os mediadores, eis que, de súbito, o cessar-fogo deu-se e a troca de prisioneiros e reféns começou. Com o confessado alívio do ministro do Qatar, que admitiu a importância do enviado de Trump.
Não retiro daqui mais do que os factos. Mas parece-me mais significativo questionar estes factos e tentar entender-lhes o significado do que fazer psicologia de vão de escada.
Sei bem, sabemos todos, que isto vai continuar, E o que é mais insuportável é a tentativa acrítica de parodiar Trump e fazer dele o mau da fita, enquanto se incensa um dos mais sanguinários – em modo sonso – presidentes norte-americanos das últimas décadas – se é que a escolha tem sentido, tal é a concorrência.
Porém, a verdade é que nunca ouvimos de Biden um projeto de paz, uma vontade de verdadeira segurança. Todo o processo de destruição do presente e do futuro de Gaza teve o seu entusiástico apoio. Belicismo e negócios é o seu jogo. Foi toda a vida. O seu discurso de despedida, recebido com vénias e respeito pelo nosso comentariado televisivo, teve um passo muito comentado, no qual advertia os norte-americanos de que o futuro governo seria apoiado por uma oligarquia, um horror.
Ora, come on, Joe, em que tempo mítico os EUA não foram governados por uma oligarquia? Mais ou menos discreta, mas sempre uma oligarquia. E para quem se impressiona com aquela conversa infantil sobre os “homens mais ricos do mundo”, lembro que, ao pé dos grandes fundos de investimento, todos estes ricaços são pigmeus.
Não tenho dotes de adivinho, não tenho pretensões – longe de mim – de analista político. Mas parece-me tempo de estar atento aos factos e seu significado, mais do que a um circo mediático que, de bastidores bem ocultos, vai agitando os seus palhaços e tentado entreter basbaques enquanto a história lhes vai passando ao lado.
Do blogue Estátua de Sal
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