Quando o primeiro-ministro português diz que os extremos saíram à rua no sábado passado, está a mentir e a cometer um erro crasso. Montenegro mente e erra porque a muito participada manifestação “Não nos encostem à parede” foi uma expressão da sociedade civil, onde marcaram presença associações e organizações de todos os tipos, assim como pessoas de muitos quadrantes políticos e religiosos, ao passo que a pouco participada contra-manifestação organizada pela extrema-direita foi um ritual de inspiração fascista com o intuito de alimentar o ódio contra os imigrantes. Montenegro mente e erra porque tenta colocar no mesmo plano uma grande parte da sociedade portuguesa e a extrema-direita, como se fossem duas faces de um mesmo problema, alienando assim muitas pessoas que saíram à rua para defender valores transversais a todo o espectro político democrático. Montenegro erra porque dá a entender que o debate de ideias na sociedade portuguesa não se passa senão entre os extremos, o que afasta o centro da possibilidade de defender valores e ideias. Montenegro mente porque cria a noção de que praticar o direito à manifestação é uma forma de extremismo. Montenegro mente e erra porque tenta convencer-nos de que é neutral na questão da defesa dos direitos e liberdades civis, que é neutral na questão do racismo. Erra porque estas são questões em que um primeiro-ministro de uma democracia não pode ser neutral, porque o Estado de direito não é neutral, a Constituição não é neutral. Mente porque sabemos bem que não é neutral, que já evoluiu do “não, é não” para a adopção da retórica populista que prefere as percepções aos factos. Montenegro erra porque tenta pedir emprestado o vocabulário da extrema-direita pensando que assim a vai comedir ou captar o seu eleitorado, mas esse é precisamente o caminho que vai empurrar a direita tradicional para o beco sem saída das alianças com a extrema-direita.
A única hipótese de estas declarações de Montenegro não serem um enorme erro, é serem uma mentira ainda maior e a decisão de uma aliança com a extrema-direita já estar tomada. Essa mentira seria o mais imperdoável dos erros.
Foto de Diogo Ventura.
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