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quarta-feira, 4 de dezembro de 2024

Mandei o soldado soltar o preso:

Dei-lhe o resto das minhas latas da ração de combate, que já não comia, enjoado, e apontei uma direção: «Zâmbia, gosse, gosse!» Já sabia algumas palavras dos idiomas locais, como «depressa». Um dos soldados perguntou-me: «Mata-se?» Neguei com a cabeça. O capturado afastou-se a andar de lado, olhando para nós, incrédulo e à espera de ser morto; vi-o afastar-se, primeiro lentamente, depois a correr, e desaparecer. Eu viajava sozinho.

Devia dar essa oportunidade e respeitar esse direito aos que se cruzavam comigo. Restava procurar uma zona para os helicópteros aterrarem e me levarem de regresso. Seria a última operação que fiz em Moçambique” (…) O meu 25 de Abril de 1974 começou em Tete, Moçambique, em maio ou junho de 1971, a perguntar-me o que andava a fazer em África. Combatia e conduzia os soldados a quem o Estado português, através do seu governo, impunha o dever do serviço militar obrigatório. Precisava de ter certezas quanto à razão ou razões pelas quais me encontrava em Tete, Moçambique, numa guerra que começara há dez amos, para lhes poder dar uma resposta, como era meu dever. Na guerra de guerrilha, realizada por pequenos grupos isolados, a hierarquia assenta mais na confiança pessoal do que na graduação dos postos das Forças Armadas e por isso nestas unidades os seus elementos fazem poucas perguntas. Confiam.” GOMES, Carlos de Matos – Geração D: Da ditadura à democracia. Lisboa: Porto Editora, 2024, pp 21 e 22.

Miguel Moura

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