O nome Honorina é comum nas mulheres da minha família materna. A minha bisavó chamava-se Honorina, a minha avó chamava-se Honorina Serpa, a minha mãe era Honorina Serpa, a minha irmã mais velha (mas mais nova que eu) chama-se Maria Honorina.
A minha avó Honorina emigrou dos Açores (ilha do Faial) para os Estados Unidos no início do século XX, foi acolhida na Ilha de Ellis, como os emigrantes idos da Europa, com 18 anos atravessou o continente americano para se reunir com o marido, António Serpa, na Califórnia, no Vale de São Joaquim. A minha mãe nasceu aí e aí viveu até os meus avós decidirem regressar aos Açores antes da Segunda Guerra com o pecúlio ganho e se instalaram numa quinta na freguesia da Feteira.
A que propósito vem esta saga familiar? É que hoje recordei uma palavra que a minha avó Honorina usava com propósito e que caiu em desuso: Rebotalho! Rebotalho era e é o que sobra depois de escolhido e retirado o melhor e o mais aproveitável; refugo; qualquer coisa inútil e sem valor. O elenco que surge nos ecrãs das televisões seja na informação seja na gozação é rebotalho. Em claro, aquilo que vemos e que se nos propõem governar são rebotalho. Macron e o seu efebo primeiro ministro, Melanchon, as warmongers Kallas e Von Der Leyen, a senhora Lagarde, o senhor Sholz da Alemanha, a senhora Meloni de Itália são o rebotalho, o que sobrou de Berlusconi e de Blair, por exemplo. O rebotalho não se reduz à senhora Le Pen, o rebotalho tomou conta da Quinta dos porcos de Animal Farm, de Orwell. Obrigado avó, pela palavra!
Mas há um refrigério: não estamos condenados ao rebotalho. Hoje trago para o meu lado três personalidades que me resgatam do rebotalho, Fernando Salgueiro Maia, que faria 80 anos e está a ser homenageado em Castelo de Vide, a sua terra Natal, o Fausto Bordalo Dias, que escreveu uma Peregrinação em versos e músicas geniais e que hoje morreu e, por fim, António Antunes, o que mais próximo podemos chegar do que é o português, mistura em desenho de Gil Vicente, de Bocage, de Bordalo, de Luiz Pacheco, de Alexandre O’ Neil, das redações da Guidinha, da Noite e o Riso de Nuno Bragança. António é um refrigério contra o rebotalho. Tenho o privilégio do convívio com António, que ele continue vivo, como vivos para mim estarão sempre homens de coragem e sentido do dever como Salgueiro Maia, homens que fizeram e fazem universal a cultura portuguesa, como Fausto. Restará o rebotalho que é servido como lavadura aos que se satisfazem com que os tratadores lhes atiram.
Carlos Matos Gomes
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