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quinta-feira, 1 de setembro de 2022

Agradeço-te, Marta:

1.

Marta Temido não tinha condições para continuar a ser ministra da Saúde.

Foi um erro político de António Costa quando a escolheu para continuar à frente do Ministério.

O primeiro-ministro decidiu assim pela mesma razão que o deveria ter levado a não a manter.

Depois do combate contra um vírus que mobilizou, como nunca antes, o Serviço Nacional de Saúde.

Depois de os médicos e enfermeiros, e as respetivas ordens profissionais, terem suspendido as suas reivindicações em nome da defesa do essencial, Temido seria sempre um obstáculo inultrapassável a qualquer reforma.

Após uma guerra, qualquer que ela seja, ficam feridas que se pagam caro quando chega a paz. Marta Temido ficará para a história como uma das figuras maiores da excecional resposta ao vírus. Foi ela a pedir todos os sacrifícios, todo sangue e todas as lágrimas. Estava na cara que quando o assunto deixasse de ser assunto mais ninguém a conseguiria ouvir.

É injusto.

Mas é humano.

Poucos são os que aguentam, como se nada fosse, depois de protagonizarem um acontecimento tão marcante como este foi.

António Costa deveria ter-lhe dado um outro qualquer lugar. Teria sido justo.

2.

Posto isto, Marta Temido merece a nossa consideração. E o nosso agradecimento.

Nos dois anos de inferno esteve sempre na primeira linha.

Quando faltavam ventiladores ela esteve do lado da solução.

Quando se começaram a somar ameaças de catástrofe ela ofereceu-nos o seu melhor.

Quando em janeiro de 2021 as mortes atingiram o seu ponto mais alto e tanta gente começou a soçobrar, manteve-se no seu posto, deu a cara, mostrou coragem e firmeza.

Fez o que lhe competia, dirão alguns.

Muito bem, mas fez.

E não era fácil não deixar a coragem evaporar-se, não era difícil deixar-se derrotar pelo cansaço e pelas derrotas, exasperar-se com as diferentes opiniões, com as dúvidas, com o mundo a desmoronar-se, com a pressão da opinião pública e das televisões.

3.

Marta Temido saiu.

Deveria ter sido poupada a estes meses - hoje seria uma heroína.

É sempre o que é.

E não o que poderia ter sido.

É a vida nas suas inapeláveis contradições e paradoxos.

4.

Há quem esteja interessado na derrota do SNS. Há muito dinheiro em jogo e Marta Temido era o alvo a abater por muita gente focada mais nos seus bolsos do que no interesse comum.

É bom que não sejamos totalmente ingénuos.

Mas é vital também que a reforma se faça.

Um país não pode ver grávidas a morrer em ambulâncias a caminho de maternidades sem médicos ou camas.

Um país não pode deixar morrer o futuro.

Que o próximo ministro ou ministra tenha a capacidade de encontrar soluções e tenha a força política e a frescura para ir à guerra com quem merece perder.

E que Marta Temido possa finalmente descansar.

Luís Osório

Na TSF

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