Durante cinco longos dias a mulher guardou cuidadosamente os 100euro
que lhe tinham sido confiados. Ao sexto, convenceu-se que o legítimo dono não
regressaria e decidiu dar-lhe destino. Entregou o dinheiro ao talhante para
saldar uma dívida de meses que a atormentava. Sem acreditar na sua sorte, o
talhante entrega os 100euro à sua mulher, que os usa para pagar à modista o
vestido que usara para o casamento da filha, três meses antes. A modista, por
sua vez, agradeceu a possibilidade de pagar, com atraso, a renda do quarto em
que vivia. Também o digno proprietário tinha uma dívida antiga para com a
prostituta da terra que poderia agora, finalmente, pagar à estalajadeira da
pensão local os 100euro que lhe devia pelo aluguer ocasional de quartos.
Em poucos dias a nota voltou ao seu local de origem, e às mãos da
estalajadeira em quem o forasteiro confiara. Não existiu nova produção, mas
dívidas da população foram liquidadas e o otimismo reinava a pequena vila.
Semanas mais tarde, o abastado homem regressa à pensão e percebe,
espantado, que os 100euro ainda o esperavam. E é não menos estarrecida que a
estalajadeira vê então o forasteiro pegar na nota, pegar-lhe fogo, e com ela
acender o seu charuto para, logo depois, soltar uma gargalhada e confessar
"a nota era falsa de qualquer forma".
A fábula não é minha. Foi contada muitas vezes, e aconteceu mesmo. Em
1920, Alves dos Reis, um burlão qualificado, ajudou a resolver o problema de
deflação da economia portuguesa ao forjar uma encomenda de notas, em nome do
Banco de Portugal, à empresa inglesa Waterlow.
Moral da história? Decerto não passa por defender a falsificação de
dinheiro. Apenas demonstrar, pela enésima vez, que a economia de um país não
tem nada a ver com a gestão de um orçamento familiar. E que há muitas formas de
solucionar a armadilha do endividamento sem o custo da pobreza, da recessão e
do desemprego. O problema não está na inevitabilidade da economia, ou dos seus
instrumentos. Trata-se apenas de vontade política.
MARIANA MORTÁGUA
DEPUTADA DO BE
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