Há dias fui dar uma volta por
alguns lugares de Freamunde e fui ter ao Centro Escolar de Freamunde, situado
na Avenida da Quinta do Monte. Deu-me para comparar tempos distantes. Vi o
movimento de viaturas e de pessoas a pé a trazer de volta a casa os seus
familiares, sejam eles filhos, netos ou irmãos que ali frequentam o ensino
pré-primário e primário. Era um corrupio.
Outros tempos. Onde há
disponibilidade para os ir ali esperar. Outras condições. Porque o País levou
uma reforma impensável de há uns anos atrás aos dias de hoje.
Quer no parque escolar,
automóvel, quer no meio ambiente, incluindo as acessibilidades e o nível de
vida, etc., etc..
Com isto tudo fiz a minha memória
recuar cinquenta e sete anos. E revi como tudo era diferente.
“Somos um bando / De passarinhos;
/ vimos agora / dos nossos ninhos. / Asas sem penas, / pobres de nós! / Olho
sem brilho, / línguas sem voz.
Olhos bondosos / do
mestre-escola, / fartai os nossos / da vossa esmola. / Dai-nos abrigo / no
coração; / dai-nos o trigo / do vosso pão.
Pão de ventura, / pão de riqueza,
/ manjar de beijos / na nossa mesa. / Farinha rara, / de estimação, / tem o
fermento / do coração.
Portais da escola, / dai arribada
/ às cotovias / da madrugada. / Asas sem jeito, / língua sem voz, / almas
ceguinhas / pobres de nós!” “A escola" de Adolfo Portela.
Só tive a companhia da minha mãe
no primeiro dia aula. Daí para a frente lá ia o Manel sozinho e dado ao tempo.
Como é sabido o maior período de
aulas acontece nas estações do Outono, Inverno e Primavera. O Verão é mais para
o período de férias.
Também nesses meses o inverno era
mais agreste. A maior parte dos dias eram de chuva. Assim para colmatar essa
contrariedade ia-se a uma mercearia pedir um saco de serapilheira para servir
de nosso abrigo quando não era um casaco todo esfarrapado de um pai ou avô.
Os guarda-chuvas eram raros e
caros. Podia-se considerar um artigo de luxo. Hoje são oferecidos como
publicidade.
O saco de serapilheira era uma
boa dádiva e de uma utilidade que só visto. Tinha-se uma maneira de o pôr, quem
o usava, que parecíamos uns pinguins quando o colocávamos na cabeça. De vez em
quando conto aos meus filhos e netos estas tradições e trajes e eles riem-se.
Mas… era esta a nossa sina para combater a chuva.
Nesse tempo a maioria de nós ia
descalço, de calças curtas - o preço da fazenda ou do cotim era caro - e com o
estômago vazio. A maioria dos portugueses enganava-o com um bocado de broa
velha, a maior parte das vezes côdea, e um bocado de água com cevada que mais
parecia chicória.
Leite só na comunhão solene é que
veio à minha boca. Estou-me a referir ao leite de vaca. Que em pó era o meu
dia-a-dia.
As crianças que frequentavam o
ensino primário - pré-primário não existia - de menores recursos, o que era a
maioria, diga-se em abono da verdade, deslocavam-se de manhã à cantina escolar
e ali lhes era dado o tal leite em pó o qual era deitado numa malga que se
levava para o efeito já munida com a tal broa e um pouco de açúcar.
Terminado o pequeno-almoço
regressava a casa quando não ficava com outros colegas que iam jogar a bola no
campo da feira, que ficava junto à Praça do Mercado, onde estava sediada a
cantina escolar. Ao meio-dia ia comer a sopa. Só tinha aula da parte da tarde.
Lá ia sozinho para a aula que o senhor professor Valente nos ministrava.
Acabada esta, não tínhamos nenhum
familiar à nossa espera. Era o desenrasca-te. Também é certo que não havia o
trânsito que há hoje e a segurança era outra. Havia um ou outro malfeitor mas
não como hoje.
As salas de aulas não têm
comparação. As Escolas Amarelas, comparadas com o Centro Escolar, é o mesmo que
comparar uma formiga a um elefante. Ali há de tudo: boas condições para a
prática do ensino, bons recreios, dois campos de futebol, baloiços, escorregas,
e um sem número de coisas.
As Escolas Amarelas tinham um
pequeno recreio coberto e outro ao ar livre de pequenas dimensões onde
jogávamos a bola.
Há dias fui ali assistir a um
evento e reparei o quanto era pequeno. Naquele tempo ele era para nós como um
estádio de futebol. Nunca o imaginei tão pequeno. Também é certo que naquele
tempo imaginávamos a nossa pequenez como coisa grande.
Por isso o corrupio no Centro
Escolar.
Ali está concentrado todo o ensino pré-primário e primário. Não é de admirar esse corrupio quer no início ou fim da aula, quer de alunos ou familiares, a olhar para ver se encontram os seus familiares quer lhes estejam a acenar através de gestos de mãos ou através da fala.
Saíam correndo para se juntar aos familiares e os familiares continuando a dar-lhes sinais através de acenos de mãos ou através de chamamento pelo nome. E… assim comparei-os a um bando de passarinhos saídos dos seus ninhos.
Voltei para casa ainda a meditar no progresso que este mundo levou e esqueci a diferença temporal. E… estou como alguém diz: para trás mija a burra.
Saíam correndo para se juntar aos familiares e os familiares continuando a dar-lhes sinais através de acenos de mãos ou através de chamamento pelo nome. E… assim comparei-os a um bando de passarinhos saídos dos seus ninhos.
Voltei para casa ainda a meditar no progresso que este mundo levou e esqueci a diferença temporal. E… estou como alguém diz: para trás mija a burra.

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