Rádio Freamunde

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domingo, 10 de fevereiro de 2013

Divulgar a música:


Os directores artísticos e demais responsáveis pela música deviam-na promover fora dos Anfiteatros. A esses só vai a aristocracia e não o povo. Porque para esses lugares tem-se de ir vestido a rigor e há pessoas que não o podem fazer e os bilhetes são caros. O intuito da música tem por finalidade a divulgação de certos acontecimentos em que o povo foi o actor principal. 
"A Abertura Solene Para o Ano de 1812 é uma obra orquestral de Tchaikovsky comemorando o fracasso da invasão francesa à Rússia em 1812 e a subsequente devastação do  "Grande Armeé" (Grande Exército) de Napoleão." 
Quando a população russa sentiu a derrota do exército francês e com o toque dos sinos a rebate vieram para a rua para defenderem a sua Pátria. 
"A obra é mais conhecida pela sua sequência de tiros de canhão que é, em alguns concertos ao ar livre, executada com canhões verdadeiros."
Todas as peças de música relatam um acontecimento. Pena que os maestros no início não falem desse acontecimento. 
Em certos concertos é oferecido um guião em que relata as várias peças que vão ser exibidas. 
Mas quase que não era preciso porque quem assiste é gente entendida em música e músicos.
Onde participa o chamado povo nada disso acontece. As peças são tocadas e não há nenhuma divulgação oral a dar conta do acontecimento a não ser uma placa com o nome da peça e seu autor. 
É preciso fazer mais e até improvisar em certos concertos como este que apresento em vídeo. Em lugar de ser o público a ir ter com a música devia ser a música a vir ter com o público. Todos ficam maravilhados e é uma delícia ver a sua alegria. Não fosse o concerto o “Hino à Alegria”.

Tenho-a visto passar, cantando, à minha porta,
E às vezes, bruscamente, invadir o meu lar,
Sentar-se à minha mesa, e a sorrir, meia morta,
Deitar-se no meu leito e o meu sono embalar.

Tumultuosa, nos seus caprichos desenvoltos,
Quase meiga, apesar do seu riso constante,
De olhos a arder, lábios em flor, cabelos soltos,
A um tempo é cortesã, deusa ingénua ou bacante...

Quando ela passa, a luz dos seus olhos deslumbra;
Tem como o Sol de Inverno um brilho encantador;
Mas o brilho é fugaz, — cintila na penumbra,
Sem que dele irradie um facho criador.

Quando menos se espera, irrompe de improviso;
Mas foge-nos também com uma presteza igual;

E dela apenas fica um pálido sorriso
Traduzindo o desdém duma ilusão banal.

Onda mansa que só à superfície corre,
Toda a alegria é vã; só a Dor é fecunda!
A Dor é a Inspiração, louro que nunca morre,
Se em nós crava a raiz exaustiva e profunda!

No entanto, eu te saúdo e louvo, hora dourada,
Em que a Alegria vem extinguir, de surpresa,
Como chuva a cair numa planta abrasada,
A fornalha em que a Dor se transmuta em Beleza!

Pensar, é certo, eleva o espírito mais alto;
Sofrer torna melhor o coração; depura
Como um crisol: a chispa irrompe do basalto,
Sai o oiro em fusão da escória mais impura.

A Alegria é falaz; só quem sofre não erra,
Se a Dor o eleva a Deus, na palavra que O louve;
A Alma, na oração, desprende-se da terra;
Jamais o homem é vão diante de Deus que o ouve!

E contudo, — ilusão!—basta que ela sorria,
Basta vê-la de longe, um momento, a acenar,
Vamos logo em tropel, no capricho do dia,
Como ébrios, evoé! atrás dela a cantar!

Mas se ela, de repente, ao nosso olhar se furta,
Todo o seu brilho é pó que anda no sol disperso;
A Alegria perfeita é uma aurora tão curta,
Que mal chega a doirar as cortinas do berço.

Às vezes, essa luz, de tão frágil encanto,
Vem ainda banhar certas horas da Vida,
Como um íris de paz numa névoa de pranto,
Crepitação, fulgor duma estrela perdida.

Então, no resplendor dessa aurora bendita,
Toma corpo a ilusão, e sem ânsias, sem penas,
O espírito remoça, o coração palpita
Seja a nossa alma embora uma saudade apenas!

Mas efémera ou vã, a Alegria... que importa?
Deusa ingénua ou bacante, o seu riso clemente,
Quando, mesmo de longe, ecoa à nossa porta,
Deixa em louco alvoroço o coração da gente!

Momentânea ou falaz, é sempre um dom divino,
Sol que um instante vem a nossa alma aquecer...
Pudesse eu celebrar teu louvor no meu Hino!
Momentâneo, falaz encanto de viver!

O teu sorriso enxuga o pranto que choramos,
E eu não sei traduzir a ventura que exprimes!
Nesta sentimental língua que nós falamos,
Só a Dor e a Paixão têm acordes sublimes!

António Feijó, in 'Sol de Inverno' 

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