“No auge da felicidade por ter conseguido a água que salvaria seu pai e
ansioso por se ver no palácio pulou sobre a sela e partiu a galope. Na floresta
encontrou o anão no mesmo lugar, o qual vendo a espada e o saquinho de trigo
disse: "Fizeste bem em guardar este precioso tesouro. Com essa espada
vencerás sozinho o mais numeroso exército, e com o trigo desse saquinho terás
todo o pão que quiseres e nunca se lhe verá o fundo." O príncipe estava
porém apoquentado com a desgraça dos irmãos, e perguntou se o anão poderia
fazer algo por eles. "Posso, ambos estão pouco distante daqui entalados em
barrancos muito apertados; amaldiçoei-os por causa de seu orgulho." O
príncipe rogou encarecidamente que os perdoasse e libertasse, e o anão cedeu às
suas súplicas.
"Mas te advirto que te arrependerás. Não te fies neles, são de mau
coração; liberto-os apenas para te ser agradável." Assim dizendo fez os
barrancos se afastarem libertando os entalados, pouco depois reunidos ao irmão
que os esperava. Muito feliz por tornar a vê-los o príncipe lhes narrou suas
aventuras e disse que daí a um ano voltaria para desposar a maravilhosa princesa
e reinar com ela sobre um grande país. Puseram-se os três de regresso para
casa. Atravessaram um reino assolado pela guerra, estando o rei desesperado de
poder salvar-se e a seu povo. O príncipe confiou-lhe então o saco de trigo e a
espada mágica, com os quais o rei derrotou os exércitos invasores e encheu os
celeiros até o forro. O príncipe tornou a receber a espada e o saquinho de
trigo e os três irmãos seguiram viagem, tomando um navio para encurtar o
caminho.
Durante a travessia os dois irmãos mais velhos, devorados de ciúmes,
começaram a conspirar contra o mais novo. "Nosso irmão conseguiu a Água da
Vida e nós não; com isso nosso pai o promoverá a herdeiro do trono que deveria
ser nosso e nada nos restará." Então juraram perdê-lo. De noite quando ele
dormia furtaram-lhe o frasco e substituíram a Água da Vida por água salgada.
Tentaram também roubar-lhe a espada e o saquinho de trigo mas os objectos
desapareceram de repente.
Chegando em casa o jovem correu para o pai e lhe apresentou o frasco
para que logo sarasse. Mal engoliu alguns goles daquela água salgada o rei
piorou sensivelmente. Estava se lastimando quando chegaram os mais velhos e
acusaram o irmão de ter querido envenenar o pai. Eles porém traziam a
verdadeira Água da Vida e lha ofereceram. Apenas bebeu alguns goles pôde se
levantar do leito cheio de vida e saúde como nos tempos da juventude. O pobre
príncipe, expulso da presença do pai, se entregou ao maior pesar. Os dois mais
velhos vieram ter com ele rindo e mofando: "Pobre tolo! Tu tiveste todo o
trabalho e conseguiste encontrar a Água da Vida mas nós tivemos o proveito;
devias ser mais esperto e manter os olhos abertos, enquanto dormias a bordo
trocamos o frasco por outro de água salgada. E poderíamos se quiséssemos ter-te
atirado ao mar para nos livrarmos de ti, mas tivemos dó. Livra-te contudo de
reclamar e contar a verdade ao nosso pai, que não te acreditaria; se disseres
uma só palavra não nos escaparás, perderás a vida. Também não penses em ir
desposar a princesa daqui a um ano, ela pertencerá a um de nós dois."
O rei estava muito zangado com o filho mais moço, julgando que o
quisera envenenar. Convocou seus ministros e conselheiros e lhes submeteu o
caso. Foram todos de opinião que o príncipe merecia a morte e o rei decidiu que
fosse morto secretamente por um tiro. Partindo o moço para a caça sem suspeitar
de nada um dos criados do rei foi encarregado de o acompanhar e matar na
floresta. Chegando ao lugar destinado o criado, que era o primeiro caçador do
rei, estava com um ar tão triste que o príncipe lhe indagou a razão: "Que
tens, caro caçador?" - "Proibiram-me de falar, mas devo dizer
tudo." - "Diz então o que há, nada temas." - "Estou aqui
por ordem do rei e devo matar-vos." O príncipe se sobressaltou mas disse:
"Meu amigo, deixa-me viver. Dar-te-ei meus belos trajes em recompensa e tu
me darás os teus, que são mais pobres." - "Da melhor boa
vontade" disse o caçador. "É preciso que o rei julgue que executaste
suas ordens senão sua cólera recairá sobre ti. Vestirei estas roupas feias e tu
levarás as minhas como prova de que me mataste. Em seguida abandonarei para
sempre este reino." Assim fizeram.
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