Sobre "a esquerda que não
faz nada pelas pessoas", lembram-se de quando a Geringonça entrou em
campo, e se ouviu um enorme suspiro de alívio em todo o país?
Pode ser percepção minha, mas
tenho ideia de que, repentinamente, já não era preciso ultrapassar a troika
pela direita.
Nos primeiros dois meses, a
Geringonça reverteu boa parte das políticas duríssimas do governo de direita.
Baixou a carga tributária nos grupos de rendimentos mais baixos, devolveu
salários na função pública e aumentou o salário mínimo.
Lembro-me em particular de ter
posto fim a uma situação terrível do tempo da troika: as famílias que perdiam
as casas em que viviam por, devido à crise, não conseguirem pagar o empréstimo
bancário.
Foi há 10 anos. Já esqueceram? Ou
fui eu que sonhei?
Há descontentes? Pois claro que
há descontentes! É impossível agradar a gregos e troianos, sobretudo quando uns
querem sol na eira e outros querem chuva no nabal, e os terceiros nem sabem o
que querem, mas querem já, imediatamente, perfeito e sem demora.
O caso do alojamento local é um
bom exemplo da dificuldade de governar: se o governo tenta evitar a passagem de
habitação para turismo, os donos das casas que precisam do dinheiro protestam.
Se o governo não faz nada, os que andam desesperados para arranjar casa
protestam.
Há sempre descontentes.
Se fossemos um país rico,
riquíssimo, podíamos resolver os problemas atirando-lhes dinheiro para cima.
Mas não somos.
Pelo que haverá sempre
descontentes.
E mesmo que fôssemos riquíssimos,
haveria sempre alguém a protestar, e a sentir-se deixado para trás por não ter
tanto como lhe parece que o vizinho tem, a criticar tudo o que é feito e tudo o
que fica por fazer.
Finalmente: se é para andar à
procura de culpados do que aconteceu nas eleições do dia 18 de Maio, convém ter
também presente que andamos a ser manipulados nas redes sociais por forças
poderosíssimas apostadas em desestabilizar os sistemas democráticos; que - como
se vê na nova era inaugurada por Trump e Musk - é possível comprar as eleições
descaradamente; que o edifício da cooperação internacional é extremamente
sensível, e um país sozinho não tem grande margem de manobra; que o grande
capital inventa sempre maneiras de escapar ao controlo; que o racismo e a
xenofobia correm docemente no silêncio dos corações até aparecer o primeiro
flautista de Hamelin a fazê-los sair da toca.
Os partidos do arco democrático
portugueses fizeram muitas asneiras, pois fizeram. Mas é injusto e perverso
atirar para cima deles as culpas de tudo.
Porque, de facto, andamos há anos
a jogar Calvinball.
(Se não entenderam a última
frase, vão ler Calvin & Hobbes. Sempre aproveitam melhor o tempo que
andando por aqui a bater nos "partidos de esquerda que se esqueceram do
que deviam ser".)
Enviado por: Helena Araújo
Do blogue 2 dedos de conversa
Sem comentários:
Enviar um comentário