E acrescentou, “o jornalismo sério deve filtrar as vozes que merecem ser ouvidas e eliminar os charlatões,” “o problema reside na irresponsabilidade dos media em continuar a dar-lhes palco.” De lápis azul na mão, JG é que sabe quem deve ser selecionado como analista, porque ele é que é sério, ele é que percebe aquilo que é bom para o povo. Pensar de modo diferente é delito de opinião.
Se a voz de JG chegasse ao céu, Friedrich Hayek, a grande referência ideológica do partido em que milita, estaria a corar de vergonha, por um seguidor seu defender a censura e mandar calar a opinião discordante.
Seria (hipoteticamente) impensável, quando nos preparamos para comemorar os cinquenta anos da Constituição da República portuguesa, defrontarmo-nos com um funcionário de um partido com representação parlamentar, pelos vistos desconhecedor da sua matriz ideológica, a apelar publicamente e sem qualquer pudor à censura e ao silenciamento de vozes que não são do seu agrado, manchando a reputação democrática do seu partido.
JG faz tábua rasa dos valores liberais, dos direitos individuais e da liberdade de pensamento e de expressão. A defesa do “cancelamento” assume maior gravidade quando JG não é a única voz a achar serem estas tiradas aceitáveis. O debate ideológico desapareceu, sumiu-se, e foi substituído pelo comportamento típico das claques de futebol, turbas reunidas em redor de pulsões identitárias questionáveis.
Ao não ser repudiada e tornar-se banal, esta anormalidade começa a assumir contornos alarmantes. Uma nuvem negra adensa-se sobre a democracia portuguesa, criando um ambiente pestilento. Parece que o combate que se avizinha já não será o de a aprofundar, mas apenas o de a manter viva.
Debates sobre temas como a liberdade de expressão, que se julgavam extintos, por serem desnecessários, afinal não estão. É profundamente preocupante que um militante de um partido democrático defensor dos valores liberais e que reclama o direito de descer a avenida da liberdade no dia 25 de abril, tenha a ousadia e a falta de discernimento de defender estas ideias. Sabemos que no melhor pano cai a nódoa e que JG certamente está no partido errado.
O drama que envolve estas anormalidades parece não se restringir a Portugal. Na Europa pairam movimentos semelhantes, onde se cancelam eleições e se impedem candidatos de concorrer, apenas porque pensam de modo diferente do main stream. A matriz dos que pensam como JG levar-nos-á, cada vez mais, a um beco onde a saída será a perda daquilo que até aqui tinha sido dado como adquirido.
É muito preocupante a trivialização da anormalidade. Eu não tinha idade para participar nas ações que conduziram ao “dia inteiro e limpo, onde emergimos da noite e do silêncio”, como cantou a poetisa, mas não hesito em afirmar que se a tivesse lá teria estado. Por isso, não posso permitir que ideias retrógradas e fascizantes desta
índole, que devem ser condenadas, possam prevalecer na nossa sociedade. A Inquisição ainda está presente entre nós, com muitos candidatos a juízes do Santo Ofício. Algo errado aconteceu.
Publicado a: 09 Abr 2025, 10:56
No DN
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