Rádio Freamunde

https://radiofreamunde.pt/

sábado, 11 de dezembro de 2021

Vacinas e transparências:

A propósito de um parecer de uma comissão de especialistas sob a responsabilidade da DGS a propósito da vacinação de crianças surgiram de imediato voluntariosas vozes de políticos em campanha a exigir: Queremos o parecer, já!
A exigência de transparência é reveladora de pelo menos duas malconformações: a da demagogia e a da ignorância.
Da demagogia: para os tais dirigentes a leitura do parecer terá a mesma utilidade que a leitura do Código de Hamurabi em escrita cuneiforme acádica (wikipédia). Se eles e um número significativo de portugueses acreditam nos pareceres dos neoepidemologistas Paulo Portas e Marques Mendes, contratados como conceituados especialistas por dois grandes meios de manipulação, porque raio haviam de confiar num parecer de especialistas de ciências da saúde reunidos num órgão da administração pública, alguns dos quais trabalham em laboratórios e centros de investigação científica? Mas não é da administração pública que vivem os demagogos, sim da opinião pública e da sua manipulação.
Da ignorância: os demagogos que exigem o parecer, que podia estar escrito em aramaico, confundem dois conceitos basilares na organização das sociedades modernas, o Estado e a Administração Pública. O velho manual da OPAN - Organização política e administrativa da Nação ensinava que o Estado define políticas, a administração pública executa as ações para as levar a cabo.
A confusão (deliberada ou fruto da ignorância) entre Estado (associado ao governo) e administração pública tem como consequência a perda de capacidades dos serviços públicos em cumprir as suas tarefas de forma eficaz, cria a convicção de que mudando o governo, mudam os serviços e isso não é assim nos Estados mais desenvolvidos (reveja-se a série Yes Minister e a distinção entre o diretor-geral e o ministro) e deve ser cada vez menos assim. Essa confusão traduz-se em atraso, como o que resulta da confusão entre Estado e Religião nas sociedades islamizadas.
Acresce que a confusão entre Estado e Administração, entre política e serviços é propiciadora da desresponsabilização dos serviços, isto é, dos organismos, dos dirigentes e funcionários que detêm a responsabilidade e o saber para executar políticas.
É verdade que no imediato é sempre partidariamente mais lucrativo vender a desconfiança e a responsabilidade de todos os males à instância da política, associada ao governo em funções, do que aos serviços que têm um caráter permanente. Além de que os funcionários públicos são um rendoso mercado eleitoral.

Esta confusão abre o campo à demagogia e ao populismo. Aos vendedores de banha de cobra. A sobreposição da política e dos serviços é típica dos estados totalitários. Mas que interessam os princípios em tempo de assaltos e vale tudo?

Carlos Matos Gomes 

Sem comentários:

Enviar um comentário