Todos os indícios no-lo dizem que vamos pagar, de viés ou a direito, o
buraco de 5 mil milhões legados pelo BES. O dr. Salgado pagou, de presto, os 3
milhões de euros, caução para não ser engavetado; goza as delícias do verão na
sumptuosa villa de Cascais; dizem as notícias que possui 200 milhões de dólares
criteriosamente divididos em bancos do Oriente; e que vai envelhecer embalando
doces memórias, enquanto os seus advogados delegam para as calendas o que a
justiça tardará em dizer.
O parágrafo vai longo, mas como estas minudências dos tribunais, em
Portugal, são tardas e longas, a justificação está feita. O primeiro--ministro,
entretanto, com voz de tenor fanado, insiste em dizer-nos que não
esportularemos um cêntimo pelos desmandos dos "privados". Bom: a impostura
não tem pernas para correr. Os cerca de dois mil funcionários ameaçados de
despedimento certo; as centenas ou milhares de investidores que vão ficar sem o
dinheiro aplicado; a mistificação ultrajante entre o "banco mau" e o
"banco bom", que ninguém sabe rigorosamente o que é, nem, sequer, o
inteligentíssimo especialista da SIC, sr. Gomes Ferreira - tudo isto, e o mais
que se desconhece, terá de ser pago por alguém, e todos sabemos por quem.
As "análises" consagradas à questão são puros exercícios de
balbúrdia, que baralham as pessoas. Apenas Nicolau Santos e Pedro Santos
Guerreiro não fazem do parlapié uma conduta de espalha-brasas sobre a natureza
do problema. O resto é a triste decepção permanente. Onde está o dinheiro, a
"pipa de massa", para usar a expressão chula do pacóvio Barroso?
Apesar dos avisos cautelares dos responsáveis pelo descalabro, muitos
milhares de portugueses apressaram-se a transferir as suas parcas economias
para a CGD. O que fornece a dimensão de credibilidade e de respeito que
nutrimos pela casta que trepou aos vários poderes.
Estamos num momento crucial: é preciso ir mais além do que se ouve dos
políticos e do que secos e do que se lê nos jornais: insanidades e
mistificações. O sentido e a prática da democracia não se esgotam nas formas
jurídico-políticas, criadas e estruturadas por um "sistema", o
capitalista, bem entendido, cujo significado está cada vez mais vazio, e mais
perigoso pela sua vacuidade e objectivos. Já aqui o disse: o Ricardo Salgado
não é a causa, é o efeito - deletério e inquietante. Nem por isso deixam de
merecer punição adequada, ele e os comparsas desta monstruosa delinquência.
Comprou, por três milhões, a prestação para não ser preso. É uma imoralidade
absoluta, permitida, aliás, por uma "justiça" criada pelo
"sistema" que liquida os seres éticos e as regras de decência
previstas pela democracia. Se estes são destruídos - que nos resta?
BAPTISTA-BASTOS
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