A semana acabou, nas escadarias de São Bento, na correria em vaivém das
forças da ordem. Estas, embora manifestando-se, cumpriam a lei. A da gravidade,
pelo menos: o que sobe, desce. Ou, como diria Isaac Newton: a força de atração
entre dois corpos - no caso, o Corpo de Intervenção e o corpo de polícias
manifestantes - depende das suas massas. Sendo estas, as massas, poucas (aliás,
era a razão de todos estarem ali), a atração, a força gravítica, seria branda e
bem portuguesa. Razão tinham os dois leões no sopé da escadaria. Apesar de
simbolizarem sentinelas, eles viram subir os manifestantes e nem se mexeram na
pedra, só bocejaram, certos de que aqueles que subiam, esganiçando-se -
"Invasão! Invasão!" -, haveriam de descer. De facto, se lá no alto,
na frontaria parlamentar, há duas estátuas, a da Justiça e a da Força, o que
justificava o movimento ascendente, também há outras duas, a Prudência e a
Temperança, que remeteram os nossos polícias para a base. Por cá sobe-se e
desce-se em caracol, mesmo nas escadarias monumentais, somos terra de Manoel de
Oliveira, o dos movimentos pacatos. Não somos terra russa de Serge Eisenstein,
aquele que vendo uma escadaria logo sonha com couraçados Potemkin e revoluções
e põe um carrinho de bebé a rolar por degraus... Para tudo ser bem nosso, o
ministro podia ceder e fazer uma promessa aos sindicatos de polícia: diga-lhes
que vai mandar instalar umas escadas rolantes em São Bento.
FERREIRA FERNANDES
Hoje no DN
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