Rádio Freamunde

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domingo, 23 de junho de 2013

Faltam dezoito dias para o início das Sebastianas:

Todos os anos os festeiros surpreendem-nos com o cartaz das festas que nos vão apresentar nos dias dedicados a tal evento. Evento esse que vem do tempo dos nossos antepassados. Não há memória de como passaram a ser celebradas, a quem sabe-se, foi ao Mártir S. Sebastião patrono da peste, guerra e fome. Recordo-me delas a partir do meio da década de cinquenta. Eram vividas de uma forma bairrista como bairristas continuam hoje. Naquele tempo nós miúdos ansiávamos por elas como quem ansiava de pão para a boca. Os tempos eram difíceis. Esperava-se por elas para estriar uns sapatos, o mais velho, porque o que o sucedia recebia a sobra deste.
O senhor Gonçalves “Bisca”, que tinha uma sapataria -  confecção de sapatos, hoje utiliza-se o nome a quem os vende e não a quem os confecciona - do lugar de Moreira, na freguesia de Sousela, no fim da missa da manhã na Capela de S. António, aproveitava para tirar o molde num pedaço de papel de cartão e ali escrevia o modelo e material a usar - sola ou pneu - e não podia entrar em delongas porque as Sebastianas estavam próximas e os felizardos se preciso fosse iam a Moreira para saberem como estava a decorrer a sua confecção.
Hoje tudo se resume a Centros Comerciais em que uma pessoa pode entrar nu e sai dali vestido dos pés à cabeça. A tecnologia sofreu uma evolução que só quem passou por estas fases é que pode referenciar. Hoje tudo é fácil.
Esperávamos sentados ou jogar a bola no campo da Feira pelas barracas de diversão. Quando os camiões faziam a aparição até o miúdo que estava isolado em frente à baliza deixava a bola para correr para ver qual era a barraca de diversão: Carrossel, Carros Eléctricos, Cestinhas, Ratinho da Sorte, Aviões e Barracas de Matraquilhos.
Nos dias seguintes não faltavam miúdos a ver a sua montagem. Até se esqueciam do jogo da bola no campo da Feira. Também por esta altura o espaço era ocupado pelos festeiros para ali produzir qualquer evento.
Quando as barracas de diversões estavam montadas era usual fazerem a experiência e os miúdos que ali se encontravam eram convidados para essa experiência. Dessa maneira a maioria dos miúdos aparecia ali para não perder essa dádiva. Única forma de matar a curiosidade. Muitas vezes até nos esquecíamos de comer.
Chegava os dias de festa. Freamunde estava transformado. Que bonito! - Pensava eu - porque não sempre assim. O Ratinho da Sorte cheia de gente a comprar os bilhetes para a primeira rodada. Os namorados que estavam noivos aproveitavam para concorrer com a compra de um ou mais bilhetes. Quantos ali, depois de contemplados, escolhiam um trecho de cozinha - panelas ou tachos - para depois de casar confeccionar o almoço ou jantar. A vida... era assim.
Outros mais folgazões e com mais posses iam para os Carros Eléctricos dar azo à sua perícia. Tal era a condução que parecia que ia ao volante do seu. Mas só em pensamento. Porque ter carro nessa altura era só para milionários. 
A rapaziada de Freamunde o que que queria era chocar com outros carros. Lá vinham os empregados com cara de poucos amigos resolver o problema. Parecia um acidente em cadeia. Os mais sossegados iam para o carrocel e ali giravam sentados em bancos, cavalos, girafas ou leões, tudo em madeira.
Os casais de namorados iam para a pista de aviões para fazer voar o seu pensamento. Ali roubavam um beijo. Sim! - Naquele tempo os beijos não abundavam - era preciso uma eternidade para se receber um da sua namorada. Assim quando o avião estava no alto e escondidos do olhar das pessoas lá se roubava o beijo. Algumas coravam de vergonha. Outras exclamavam - Só agora!
Outros ainda mais aventureiros iam para as cestinhas. Ali davam uma quantas voltas que serviam de experiência a quem queria concorrer a para-quedista. 
A procissão já nessa altura era muita concorrida. Não faltava gente das freguesias vizinhas a assistir. Era de ver para crer. Contado não chegava.
A Marcha Alegórica era única aqui nas redondezas. Os seus carros tinham uma beleza que só vista. O senhor Leopoldo Saraiva tinha umas mãos de oiro. Entrou-se na era do plástico, - tudo era à base do papel de gazeta - este contribuiu e de que maneira para dar uma melhor manufactura e guardar para ser usado nos anos seguintes.
Chegava a hora da saída. O itinerário por onde passava era exíguo. As pessoas antes umas horas sentavam-se na borda da estrada a guardar lugar. Mas ainda faltava muito e o sono em falta fazia a sua aparição.
O Quim “Bica”, Adelino “Claudina” e outros, para conservar as pessoas de olhos abertos muniam-se de umas bisnagas com água e atiravam aos dormentes. Tudo feito com o maior respeito. 
Assim nasceu a moda do “mel”. Freamunde é uma terra de inventores. E tudo que inventa quer-lhe dar continuação. Por isso as Festas, outrora da Vila e hoje Sebastianas, têm a longevidade que tem. 
Há carinho pelo Mártir S. Sebastião mesmo não sendo o Padroeiro de Freamunde. Por isso o trabalho durante trezentos e sessenta e cinco dias. O esmero. A publicidade para que as Sebastianas sejam uma realidade.
Por isso o desabafo de um festeiro quando disse: - “As Sebastianas são o meu segundo filho, a minha segunda mulher, a minha segunda casa e a minha segunda vida…”
Se nunca cá veio está convidado para comprovar.

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