Exmo. Sr. Presidente da República,
Começo hoje o meu caminho de saída. Saio do meu país levando comigo os
meus trinta anos, os meus sonhos, a minha força e vontade de trabalhar. Saio do
meu país escorraçada por uma economia podre e corrupta; por políticas sujas e
elitistas; por políticos que há mais de trinta anos governam as suas vidas ao
invés de governar o país. Onde o senhor se inclui, Sr. Presidente da República.
Começo hoje o meu caminho de saída. E deixo para trás um país que
premeia o trabalho com pedidos de sacrifícios, o esforço de uns com a opulência
descarada da vida de outros, os sonhos com frustração e desespero. Deixo um
país a lutar pelo futuro e levo comigo a mágoa de não ficar para a luta. Mas a
minha vida já esperou de mais; o meu filho de dois anos já esperou demais, já deve
demais. Viver neste país tem sido uma teimosia que, para mim, termina agora.
Não sei se volto. Farei parte da grandiosa diáspora que V/ Ex.ª se
farta de elogiar e louvar em folclóricos eventos, de gente que foi escorraçada
do seu país? Serei um dos brilhantes cérebros em que os país investiu e que,
estupidamente, mandou embora? Serei um dos repetidos exemplos daqueles que só
depois de deixar o país alcançam o respeito do mesmo país que os ignorou
enquanto lutavam por ele? Serei uma pessoa, mais uma, uma cabeça e um corpo a
lutar num país que não é o seu? Isso, de certeza.
Deixo o meu país e sei que vou encontrar oportunidades novas e novos
desafios. Mas não vo-lo agradeço. E dispenso os discursos paternalistas de que
"há males que vêm por bem", de que devo receber com entusiasmo as
dificuldades da minha vida porque elas escondem oportunidades imperdíveis.
Dispenso esse discurso porque o meu país me retirou a possibilidade de escolha.
Dispenso o seu paternalismo. A sua pena. O seu desprezo pela classe a que
pertenço. Dispenso os seus discursos, os seus silêncios, as suas palavras, as
suas reservas em contribuir para a governação de um país onde é Presidente da
República. Dispenso-o.
Ainda assim, dirijo-me a si, porque, contra a minha concordância e o
meu voto, é o Presidente da República do meu país. E tem responsabilidades, E
devia pagar pela culpa que tem no estado a que as coisas chegaram. E como não
paga, tem, ao menos, de me ouvir.
Começo hoje o meu caminho de saída. De si, Sr. Presidente da República
que se dispensa de o ser, dispenso tudo. De si e de todos aqueles que, neste
momento, encaminham o meu país para o abismo.
Ana Isabel Oliveira
Sem comentários:
Enviar um comentário