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quarta-feira, 13 de junho de 2012

É aqui a noitada!

No dia seis de Junho do ano corrente com o intuito de se divertirem na noitada da festa em honra do Corpo de Deus, em Paços de Ferreira, um grupo de cinco jovens do sexo feminino dirigiram-se ali, para se divertir. Como viram pouca gente na romaria, os ponteiros do relógio ainda não tinham chegado às vinte e quatro horas, ficaram perplexas com esta situação. Nesse momento passava a pé,  um grupo de jovens do sexo masculino, resolveram parar o automóvel e de dentro dele a motorista resolveu meter conversa. - Não é aqui que há uma festa com uma noitada com muita gente? Não! - Respondeu um jovem do grupo. Essa festa realiza-se em Julho. Chamam-se Sebastianas e são realizadas em Freamunde. Se estavam perplexas com o que viam mais ficaram com o que ouviram da boca do jovem. Não os conheciam, assim como eles a elas, senão sentiam-se gozados e a resposta era talvez provocatória. É raro numa festa de outra terra, perguntar se é ali que há uma noitada grande e obter como reposta essa frase, mais a mais, quando as datas de uma e de outra são tão díspares. Se fossem no mesmo dia... vá que não vá.
Este intróito tem a finalidade de demonstrar o quanto são famosas as Sebastianas. Os Freamundenses têm bastante carinho pelo Mártir S. Sebastião além de não ser o padroeiro de Freamunde – para quem não saiba é S. Salvador. Não há freamundenses entre nós que se lembre das primeiras festas. Há um ou outro com idade bastante avançada que se lembra e diz que a iluminação baseava-se em archotes e pinhas de pinheiro a arder para alumiar os foliões. Dizem que essa iluminação era desde S. Francisco ao Cruzeiro e que se tornava linda a sua coreografia.
Depois com os anos foram-se modificando. Em lugar dos archotes e pinhas de pinheiro vieram os arcos em madeira e com luzes só de uma cor: branca. De um dia passou a dois – sábado e domingo – depois com esforço foi-se investindo cada mais mas sempre dentro das possibilidades do burgo. Nos anos das décadas de cinquenta, sessenta e setenta as festas da Vila, não tinham a projecção que a partir da década de oitenta ganharam, sendo que a partir do ano dois mil a transformação foi enorme.   
Mas há que dar a real importância aos que tiveram a feliz ideia de venerar o Mártir S. Sebastião com um dia de festa. Depois com uma noitada, de um dia passou a dois e por aí adiante. É evidente que temos de destacar individualidades que além, do seu esforço físico, teve ainda o da própria carteira.
Houve uns anos em que as festas da Vila, como eram conhecidas nessa época, não se realizaram por divergências com o Bispo do Porto. Os Freamundenses não temem dificuldades e individualidades e puseram todos os seus recursos em movimento para de novo porem as festas da Vila em marcha. Nos anos cinquenta lá apareceram elas. De ano a ano notava-se a sua pujança. Voltaram os Freamundenses a ter na sua liderança homens que hoje são recordados e que não os enumero porque seria fastidioso tal a quantidade deles, desde que se realizam, deve haver uns milhares que já desempenharam o papel de festeiro.
Outros que se destacaram pelo empenho com que alegravam os foliões e aqui recordam-se Quim “Bica”, Adelino da “Claudina” e Quim “Loreira”. Davam animação à noitada com as suas brincadeiras e trapalhadas. Eram tempos difíceis.
Tomou-se a iniciativa de passar de dois para três dias, o número de dias de festejos, sendo que o seu início era no sábado e findava na segunda-feira. Quando se acrescenta mais dias também se tem de idealizar eventos para distrair e alegrar quem ali se desloca. Não basta acrescentar dias. Se na noitada de sábado além das barracas de diversão havia ainda um espectáculo de folclore, no domingo a procissão do Mártir S. Sebastião incorporada com vários andores, anjinhos, diversa confraria e as bandas de música. À noite o “combate” das bandas de música, com temas do agrado do público em que a rivalidade subsistia com a habitual cordialidade que é apanágio dos Freamundenses. No encerramento tocavam umas rapsódias e um até ao ano. Na de segunda-feira resolveu-se criar uma marcha alegórica com criticas à vila. Tínhamos entre nós artesãos de alta qualidade.  
O senhor Leopoldo Saraiva que era quem produzia os cenários para o grupo de teatro de Freamunde propôs-se tomar a iniciativa de tal evento. Ainda me lembro de o ver a ornamentar os carros alegóricos numa oficina de mecânica que havia no lugar da Boavista na casa da família Costa. Com as suas mãos mágicas dava um toque divino nos carros alegóricos. Depois da sua morte veio a família “Moca” que também com umas mãos mágicas deram seguimento na elaboração de vários carros alegóricos. 
Morreu o pai e o filho Fernando, como tinha morrido o senhor Leopoldo Saraiva, mas aparece sempre alguém com ou sem mãos mágicas que contribuem para que a marcha alegórica seja um valor acrescentado na noitada de segunda-feira. Há um nome que quero realçar e que a partir daí não houve sucessor que foi o senhor Luís Monteiro. Não era natural de Freamunde, trabalhava na fábrica Albino de Matos Pereira & Barros, - Fábrica Grande – vivia em Figueiró, presenteava-nos todos os anos com um grupo cómico e que muito divertia e agradava os foliões.
É neste particular que somos diferentes. Além de possuirmos mão-de-obra, fundo de maneio, que vai dando para as necessidades, temos forasteiros que colaboram na sua grandeza. Assim vamos de ano a ano com as dificuldades previstas e as que aparecem elevando cada vez mais o nosso Santo Mártir. Julgo que se ele pudesse falar dizia o seguinte: Não sou merecedor do vosso esforço o que fiz e a minha morte não merece tanto trabalho mas estou-vos grato. O Mártir S. Sebastião já convive connosco há muitos e muitos anos e tem por obrigação de saber a nossa tempera. 
Somos pobres mas laboriosos. É um ano de intenso trabalho, desde a terça-feira a seguir às festas à terça-feira do ano seguinte. Estes trezentos e sessenta e cinco dias são vividos com alegria, tristeza, lágrimas que às vezes apetece verter, aborrecimentos com a esposa, é um ano que não se pode dar a importância que ela merece, com alguns amigos por diversas discordâncias.
Mas vale a pena. Se aqui aparecer um carro com cinco mulheres e perguntarem se é aqui que há uma festa com uma noitada grande, podemos dizer-lhe que há várias, que todas elas são muito concorridas e divertidas e é por isso que são tão afamadas. O seu único objectivo é em prol da comunidade sendo ela de Freamunde ou seus arredores.
Os Freamundenses são assim: cordiais e hospitaleiros.

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