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terça-feira, 28 de março de 2023

A INDÚSTRIA DO MOBILIÁRIO ESCOLAR EM PAÇOS DE FERREIRA:

O Professor Albino de Matos nasce nos finais de século XIX, no denominado "Século da Escola", e, naturalmente, vai assimilar toda uma vivência centrada numa aposta na educação que era por todos considerada a causa mais directa da prosperidade do país. As escolas multiplicam-se por toda a parte, aumenta a população escolar e com ela agravasse todo um conjunto de velhos problemas de higiene escolar, ligados à concepção do próprio edifício e do mobiliário que nele existe.
Educar as crianças de forma a preservar-lhes a saúde, o desenvolvimento físico, o aperfeiçoamento moral e a cultura intelectual passam a ser a primeira preocupação, não só dos professores e higienistas, mas também do próprio Estado, nomeadamente o republicano, que insistiu na necessidade de resolver o problema cultural do país e que elegerá a instrução pública e o combate ao analfabetismo como etapas prioritárias.
Simultaneamente vivem-se momentos de forte reacção ao modelo da Escola Tradicional e tudo que a mesma significa. E a Escola Nova, aberta, descentralizada e crítica da sociedade que emerge. Valorizam-se, agora, as interacções com o meio social, as vivências do aluno e co-responsabilizam-se todos os intervenientes no processo educativo.
E à luz desta realidade que Albino de Matos se posiciona como professor primário, sendo reconhecida e louvada a sua postura pedagógica no novo processo de ensino que tão habilmente soube conduzir.
Receptivo a toda a inovação e crente na pluralidade dos recursos que o aluno deve usar para efectivar a sua aprendizagem, recria os dons de Froebel e, tal como ele, acredita na actividade lúdica como factor determinante na aprendizagem das crianças, sendo um propagador e programador do ensino objectivo nas escolas primárias.
Albino de Matos foi também um homem de forte pendor cívico, interveniente, participativo, zelador dos interesses da sua comunidade.
Mas não foi só no campo pedagógico e cívico que deu provas de inteligência e faculdades de trabalho.
De facto, Albino de Matos, tinha vocação de empreendedor e notando quão defeituoso e impróprio era o mobiliário e material didáctico das nossas escolas, montou uma oficina, criou e aperfeiçoou tipos de carteiras e outro material. Sabia muito bem o que o mercado precisava e produziu-o de acordo com as novas normas higiénicas. O percurso da sua vida, após ter deixado o ensino, vai ser pautado por importantes conquistas comerciais até à sua morte em 1918.
A fábrica de Albino de Matos, Pereiras & Barros, Lda., cujo embrião remonta aos finais de século XIX, quando o professor solta o grito de revolta e põe em execução um plano maravilhoso, fruto de muito estudo e trabalho, usufruiu de um conjunto de condicionalismos que não só favoreceram o seu aparecimento, como também a sua maturidade. A sua localização perto das vias de comunicação, nomeadamente do caminho-de-ferro, (Paredes e Penafiel) facilitava-lhe o acesso aos mercados para onde a produção era escoada; o espaço rural envolvente com poucas alternativas de emprego, tanto mais que a parca alternativa ao campo seria a tamancaria ou então esta fábrica e a do Calvário pertencente a António Pereira da Costa, cuja actividade se situa nos finais dos anos 20, e a densidade populacional que era das maiores do concelho, facilitadora do recurso à mão-de-obra barata, foram as molas propulsoras do seu aparecimento e crescimento.
Os operários, que procuravam uma arte sem terem uma formação escolar, cultural ou técnica suficientes, absorviam avidamente os ensinamentos transmitidos por mestres vindos de fora, fazendo do local de trabalho uma escola de artes e ofícios. São estes operários, agora especializados no fabrico do móvel, que vêm a constituir um mercado de trabalho favorável à criação de novas indústrias nas redondezas, ou que, por vezes, se tornam fabricantes, como é o caso da fábrica de móveis de José Leal e de António Nogueira surgidas nos anos trinta. Deste modo, as características geográficas da freguesia, aliadas à reprodução socioprofissional verificada com a disponibilidade destes fundadores, constituíram um ambiente natural e humano propício à criação de novas unidades fabris, que se estenderam para além dos limites do concelho.
Paços de Ferreira é hoje o pólo central de uma vasta zona de produção de móveis, cuja origem jaz na freguesia de Freamunde, que soube aglutinar o capital e o trabalho, desde o início do século XX.
Paços de Ferreira - Capital do Móvel assume com orgulho o seu passado, reconhecendo, na freguesia de Freamunde, a génese da sua industrialização.
E, também, neste universo do mobiliário escolar que está registada a história do empenho quotidiano de alguns homens que souberam romper com a rotina ancestral dum país desfasado da Europa, modificando a face do ensino e estimulando o desenvolvimento industrial da sua terra.
Estudar a educação e o mobiliário escolar em Portugal passará, pensamos, por outros ensaios sobre o património industrial deste Concelho e por uma reflexão cuidada sobre todos os móveis, objectos e documentos que circulam nas escolas, que permitirão descobrir toda uma vivência de práticas escolares do passado, uma vez que são fontes materiais importantes para a contextualização, quer enquanto testemunho da época na sua própria materialidade, quer enquanto representação de tais práticas.

Joaquim Manuel Fernandes de Carvalho

Editado por: Manuel Pacheco 

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