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sexta-feira, 5 de dezembro de 2025

Ouvi a Senhora da IL,

Que vive de ser deputada com dinheiros públicos, aufere mais de 6 vezes o salário de mais de 3 milhões de portugueses, e, segundo o que foi publicado, antes disto foi gestora da Puaça, uma empresa subsidiária da Sonangol, petróleo angolano, na qual o pai de Mariana Leitão tinha ligações -assumirei que tudo isto foi mérito próprio -, explicar que o direito à greve não se pode sobrepor aos outros. Pode. E deve. O que não se pode sobrepor aos outros direitos é o direito à propriedade das grandes e médias empresas. As que a IL defende com unhas e dentes, a sua classe, neste caso dos médios empresários à procura de um lugar ao sol, perdão, sob a protecção do trabalho não pago. Sob a protecção da proibição de facto da greve. Eu explico.

É que qualquer cidadão que se dirija a um supermercado da Jerónimo Martins, a um Hospital da CUF, ou a um transporte da Barraqueiro não pode comer, se tiver fome, ser tratado se estiver doente, e ir visitar a mãe, se não tiver dinheiro. Porque esta senhora acha que o direito a ver remunerar a propriedade se sobrepõe ao direito à greve. Ser dono de uma riqueza colossal confere o direito a decidir quem come e quem vive. A greve serve para parar a produção e prejudicar quem vive de impedir os outros de trabalhar com paixão, saúde, comer decentemente, a greve é um grito coletivo contra a opressão e o poder. Se não, não é greve. E é isso que está neste pacote laboral - a proibição da greve. Vou repetir, o que está neste pacote laboral é a proibição da greve.
Só deve haver serviços mínimos exclusivamente onde há risco de vida, hospitais, bombeiros, etc. Nada mais. E já foi assim. Tudo o resto deve parar, para que até uma pena a cair no chão se escute. Ora este pacote ilegaliza de facto a greve, embora mantenha que a greve é legal fazer greve (parar a produção) passa a ser ilegal. Legal é fazer uma coisa que não é greve, porque não para a produção nem prejudica ninguém.
Uma das lutas desta greve é pelo direito à greve, que a IL, Chega, AD querem ilegalizar. Mas há mais, a luta contra o trabalho não pago, com o "banco de horas". Foram os banqueiros nas horas livres que pediram esta lei? É que com o banco de horas os trabalhadores passam a trabalhar gratuitamente cerca de 10 a 15% por mês. E nas empresas da IL, quantos vão ganhar e quanto, com este banco de horas, ou seja, com este trabalho não pago? Nenhum jornalista estava lá para lhe fazer estas singelas perguntas. Quantos membros da IL vão ganhar, e quanto, com o banco de horas?
Espero que todos os professores sejam um exemplo de educação e expliquem esta semana, em qualquer grau de ensino, o que são direitos civis, políticos, e sociais (foram conquistados por esta ordem mas quase sempre todos por força das lutas sociais) e porque está a ser convocada uma greve geral. O que é uma greve, e geral, quantas houve? Como surgiram? Isso chama-se cidadania, a conquista de ser cidadão pleno, crítico, dono do saber para fazer escolhas. Claro, podem não explicar em nome da "isenção", ou seja, abdicar da sua liberdade de cátedra - prevista em todos os graus de ensino - e continuar a ensinar o programa do Governo. Que, na disciplina de cidadania, inclui como não ser cidadão - "literacia financeira" (como ser culpado por não conseguir viver com o salário mínimo) ou "empreendedorismo" (porque é que cada um é culpado pelo próprio desemprego). Assim, em vez de um programa que explica e responde às questões sociais de milhões de portugueses, à realidade objectiva, e ao conhecimento histórico, darão o programa escolar do Governo, "isento", da IL, AD, Chega e claro PS.
A escola é um lugar de conhecimento objectivo, mas não de neutralidade ética. Quando se alega a isenção - que a extrema direita adora - acaba-se a dar o programa que a extrema direita adora. Tenho um familiar a estudar na Universidade de Barcelona, recebeu emails de vários professores a explicar um dia que não ia haver aulas porque eles tinham aderido à greve pela Palestina. Este é o momento de explicar que a greve em Portugal foi colocada sob a alçada do código penal em 1849, mas que, sempre ilegal, até ao século XX, nunca deixaram de existir greves e cada vez mais. Talvez porque não tenha deixado de existir exploração. E ambos - repressão legislativa de Estado e exploração - são conceitos científicos. Ao contrário de literacia financeira e empreendedorismo, que são comunicação para justificar a desigualdade social, e a luta de uma classe, a da burguesia. A livre iniciativa individual - a ousadia dos pequenos proprietários, artistas e artesãos, não se confunde com empreendedorismo, mantra neoliberal para justificar os milhões de pessoas que tentam sobreviver na selva isoladamente, como "empreendedores", ao serviço de grandes monopólios.
Está em curso em Portugal uma das maiores lutas de uma classe - a burguesa - que com um séquito de comentadores explicam que "não há luta de classes", ou seja, que só eles lutam, os outros devem obedecer, e levar porrada, calados, sem fazer greve que chama-se greve mas não é greve. A classe que este Governo representa proibiu os imigrantes de fazerem greve (são ilegais) e ilegalizam de facto a greve (no pacote laboral). Por isso é urgente irmos às herdades apoiar aqueles imigrantes, eles são o espelho do que o Governo quer fazer a todos.
A classe burguesa diz que não é classe, que não luta, e que o que faz chama-se "modernização". Aí está outra aula de cidadania - na verdade disciplina que não devia existir, deve ser dado em história e filosofia - o que é a modernidade, não é outra coisa que não crises, guerras e revoluções. Todos, mesmo sem queremos, estamos chamados a decidir de que lado estamos, Ninguém, mesmo que seja ingénuo, estará num lugar de isenção. Todos estamos de um lado. Mais vale saber e escolher de que lado estamos, sob pena de ficarmos ao lado do petróleo Angola, ou do espancamento de imigrantes.
Raquel Varela

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