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segunda-feira, 23 de maio de 2022

ANTÓNIO COSTA EM KIEV COM DÁDIVAS :

Recebo diariamente textos da mais diversa proveniência sobre a caracterização política do regime ucraniano, alguns deles escritos por ocasião do golpe de 2014, muitos outros entre esta data e o início da guerra, outros .ainda actuais. Para tranquilidade das almas mais sensíveis as "diversas proveniências" raramente abrangem a Rússia. Não por opção voluntária, mas por serem escassas as traduções de textos dessa origem..
Nesta vasta literatura não conheço um único texto que não caracterize, com base em comportamentos políticos devidamente identificados, o regime ucraniano como um regime de extrema-direita com fortíssima influência de grupos nazis actuando em aliança estreita com os grupos oligárquicos dominantes, grupos ultranacionalistas, racistas e alguns extremamente violentos, aceites pelo actual presidente e pela sua própria mão integrados nas diversas instituições do Estado ucraniano, e não apenas nas militares como vulgarmente se pensa. É também um regime onde campeia a grande corrupção e a hostilidade aberta e declarada a certos grupos étnicos e a agrupamentos políticos divergentes da linha oficial
A predominância na Ucrânia da extrema-direita agressiva e violenta faz do regime ucraniano o principal alfobre da extrema-direita europeia. Nele se reuniram por várias vezes desde 2014, sob múltiplos pretextos, diversos grupos da extrema-direita europeia, tanto a que concorre a eleições, fingindo-se integrada no sistema para melhor o contestar e combater por dentro, como a que não hesita na prática de actos terroristas como modo de acção política.
É desta Ucrânia que estamos a falar. Da Ucrânia do Batalhão Azov, do Dnipro2, do Shaktarsk, Poltava e tantos outros. De uma Ucrânia saída de um golpe de estado perpetrado pelos Estados Unidos (Biden, como vice-presidente) e executado por milícias da extrema-direita, algumas delas disfarçadas de apoiantes do regime em vias de ser deposto, que colocaram atiradores furtivos em locais estrategicamente escolhidos da Praça Maidan para matar a tiro cidadãos indefesos e imputar os respectivos crimes ao regime deposto ou a depor. E também da Ucrânia onde milícias, depois de deposto o regime, já sem disfarces, atacaram impiedosamente as zonas russófonas chegando ao ponto de queimar vivos manifestantes pacíficos que apenas exigiam o reconhecimento da sua identidade. E também da Ucrânia que durante oito anos massacrou o Donbass, matando mais de dez mil cidadãos ucranianos que exibiam como reivindicação o respeito pela sua identidade, pela sua língua, durante centenas de anos a língua comum de todos os ucranianos. É desta Ucrânia que estamos a falar, duma Ucrânia que é politicamente a vergonha da Europa e pela qual as democracias europeias, vergadas ao peso da sua recorrente subserviência ao soberano americano, se deixaram conduzir contra a defesa dos seus próprios interesses vitais apoiando-se numa russofobia doentia, que o espectro do comunismo ajudou a fomentar durante décadas, se não mesmo secularmente, que está agora sendo usada para disfarçar e esconder a defesa de interesses que não são seus e os graves prejuízos que daí resultam para a sua autonomia económica e afirmação com polo de interesses autónomos num mundo que mais tarde ou mais cedo será multipolar, a verdadeira expressão de uma comunidade internacional democrática..
Tudo isto é tanto mais estranho quanto é certo que era essa mesma comunicação social ocidental e muitas das instituições europeias que tão negativamente qualificavaam o regime ucraniano, para que em Kiev se não acalentasse a ilusão da sua integração nas instituições europeias.
É por isso uma vergonha para a democracia portuguesa saída do 25 de Abril, a visita de António Costa a Kiev. Uma deslocação que não a honra nem engrandece por se tratar de um gesto que não foi ditado por uma opção política destinada a defender interesses portugueses, mas antes consequência de um bem urdido ambiente de vassalagem política entre cujos múltiplos deveres do vassalo se inclui este "número diplomático". Mas também a não honra, porque, ao dar palco ao regime de Kiev, a democracia portuguesa fragiliza-se e contamina-se perigosamente na defesa de regimes e governantes que não podem servir de exemplo a nenhum democrata digno desse nome.
O vírus dessa contaminação tem estado bem presente na sociedade política nestes últimos tempos. São sintomas perigosos a informação sectária e maniqueísta da guerra, acompanhada de uma campanha destinada a criar um clima emocional que rejeita de imediato a racionalidade da análise política e considera como alvo a silenciar qualquer voz discordante ou que não percorra sem hesitações toda a pauta política imposta pela propaganda dominante. São ainda sintomas dessa contaminação a denúncia como crime de lesa pátria da simples presença de um repórter de guerra do "outro lado" do conflito, como se o simples facto de alguém buscar informação plural já fosse em si um acto condenável. E são também sintomas perigosos as campanhas movidas contra quem manifestou oposição à presença de Zelensky no Parlamento. São, enfim, sintomas muito preocupantes o silêncio dos nossos principais responsáveis políticos a todo este atropelamento dos princípios democráticos bem como a rédea solta que tem sido permitida a apoiantes de Zelensky para usar o nosso país como espaço político privilegiado para intervenções inaceitáveis de descriminação e de ódio étnico.

António Costa, guardado à vista em Kiev por uniformes com caveira, generoso nas dádivas, parco na satisfação das necessitas colectivas internas como a educação e a saúde, para não falar dos salários, não mais poderá pisar solo amigo dos países de língua portuguesa sem remorsos por tantas vezes ter sido regateado a estes o que prodigaliza em Kiev sem qualquer conexão com os genuínos interesses portugueses.

José Manuel Correia Pinto 

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