Naquele tempo e lá no meu sítio as casas não se chamavam de rés-do-chão. Era rasteiras que se dizia. Ou então , térreas, porque o chão era de terra. Assim um barro batido com maço que se aguava antes de ser varrido para não levantar pó que sujasse a cantareira e a loiça de andar ao uso. Às vezes aparecia um carreiro de formigas que tanto podiam ter entrado pela chaminé como pela gateira da porta da rua, à cata de algum resto destinado aos cães, aos gatos e aos porcos e furavam uns buracos rentes às paredes de taipa onde faziam celeiros de migalhas, bagos de arroz, grãos de milho e pevides de abóbora…
Da casa de fora passava-se para o quarto, onde se dormia no catre, arredando uma cortina de chita pendurada na parede meia. Debaixo da cama ou dentro da banquinha havia um penico onde de noite se faziam os precisos para evitar saídas ao relento. Todas as almofadas se chamavam travesseiras, alguns colchões respondiam pelo apelido de enxergas e quando a família alargava e o espaço encolhia, uns dormiam com os pés virados para a cabeça dos outros…
De inverno o vento uivava na telha vã e de verão as melgas e as borboletas do gorgulho cirandavam à roda da luz bruxuleante do candeeiro a petróleo. As chaminés tinham varas para curar os enchidos, uma cruz branca na zona negra para afugentar as bruxas e um pilheira para pôr a tenaz, o espeto e a caixa de fósforos.
Ao sábado as mulheres faziam os baixos aos piais e coziam o pão para a semana ou para até quando ele não tivesse bolor e desse para fazer açordas, ao domingo os homens faziam gavelas nas hortas e pelo Natal o Menino Jesus deixava charruas de cana , bois de arame e bonecas novas de trapos velhos nos sapatinhos das crianças que os tinham.
E de maneira que era assim – diria o primo Nuno - naquele tempo, lá no nosso sítio…
Prates Miguel
Ps - Um retrato fiel da minha vivência
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