Rádio Freamunde

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segunda-feira, 18 de agosto de 2025

Carta Aberta a Marcelo Rebelo de Sousa e a Luís Montenegro:

(Mário Gonçalves, in Facebook, 14/08/2025, Revisão da Estátua)

Sobre a vergonha nacional que é virar as costas ao país em chamas.

Senhor Presidente da República, Senhor Primeiro-Ministro

Enquanto Portugal arde de norte a sul, enquanto as chamas devoram casas, florestas e vidas, enquanto bombeiros exaustos lutam dia e noite, arriscando tudo para proteger o que é de todos, os senhores… apanham banhos de sol. Como se nada fosse. Como se o drama de um país inteiro fosse apenas um ruído de fundo nas vossas férias.

É uma afronta. Uma falta de respeito gritante. Um retrato perfeito da distância que separa os corredores do poder da realidade que o povo vive na pele. Famílias inteiras perderam o teto que as abrigava. Crianças e idosos viram-se obrigados a fugir à pressa, com o fumo a queimar-lhes os pulmões e o medo a consumir-lhes o coração. Bombeiros morreram. E, mesmo assim, os senhores não interrompem o descanso dourado.

Não basta discursar sobre solidariedade quando as câmaras estão ligadas. Não basta vestir a máscara de “defensor do povo” quando, na verdade, se dá prioridade ao bronzeado em vez da presença no terreno. O país precisava ver os seus líderes no epicentro desta tragédia, não por vaidade ou pose, mas para liderar, para apoiar, para coordenar, para mostrar que a vida das pessoas vale mais do que a vossa comodidade.

E não venham com a desculpa das “agendas oficiais” ou do “trabalho remoto”. O que o povo vê é simples: quando mais precisávamos, os senhores escolheram estar longe. Escolheram não sentir o cheiro do fumo, não ver de perto a angústia de quem perdeu tudo, não apertar as mãos calejadas dos bombeiros que combatem com meios insuficientes e salários indignos.

Esta indiferença não se apaga. É mais um capítulo vergonhoso de uma classe política que se habitou a viver imune ao sofrimento real das pessoas. O vosso dever não é apenas governar quando dá jeito, é estar presente quando tudo se desmorona. E agora, senhores políticos, vocês falharam. Falharam redondamente.

Portugal não precisa de líderes que virem as costas ao fogo. Precisa de líderes que enfrentem as chamas ao lado do seu povo. E, hoje, vocês deixaram claro que não são esses líderes.

Com indignação, Um cidadão que recusa ser tratado como figurante no seu próprio país, 

Do blogue Estátua de Sal

domingo, 17 de agosto de 2025

A luta entre o velho e o novo:


Em 1932, Walter Benjamin chegou a Ibiza em busca de refúgio. Fugia da Berlim sombria, onde a crise económica e o avanço do nazismo anunciavam tempos de catástrofe. Naquela ilha, longe do turbilhão alemão, Benjamin refletiu sobre a luta entre o antigo e o moderno, entre o capitalismo decadente e o socialismo ainda frágil, mas portador de uma promessa de futuro. A sua análise, enraizada no materialismo histórico, via naquele embate não apenas uma disputa económica, mas uma guerra de temporalidades: o passado que se agarra ao poder e o futuro que insiste em nascer, mesmo sob os escombros da crise.

Quase um século depois, Portugal (e o mundo) vive um conflito semelhante. O capitalismo global, envelhecido e disfuncional, recusa-se a morrer, financiando extremas-direitas que prometem restaurar uma ordem que já não existe — ou que só existiu para uns poucos. O espectro do fascismo reaparece, não como novidade, mas como último recurso de um sistema que vê as suas bases a desmoronarem-se. A habitação inacessível, a saúde privatizada, a educação precarizada e o emprego inseguro são sintomas de uma crise que não é apenas económica, mas civilizacional.

Benjamin alertou para o perigo de uma modernidade que, em vez de emancipar, reproduz as mesmas opressões sob novas roupagens. Hoje, assistimos a uma falsa modernidade: a dos governantes que fazem festas enquanto o país arde, a dos demagogos que vendem soluções autoritárias para problemas que eles próprios aprofundaram. O "novo" que eles oferecem não passa do velho disfarçado — mais violência, mais desigualdade, mais desespero.

Mas se o passado insiste em persistir, onde está o verdadeiro novo? Para Benjamin, a esperança estava nos oprimidos que, ao tomarem consciência da sua condição, poderiam romper o continuum da história. Em Portugal, essa força só pode vir dos jovens — não dos conformados, mas daqueles que, como os seus avós em 1974, perceberem que a liberdade não se conquista com promessas vazias ou com a brutalidade fascista. Quando entenderem que a solução não está nem nos que os asfixiam com falsos liberalismos nem nos que lhes prometem ordem à custa da democracia, talvez então o novo possa emergir.

O socialismo — não como dogma, mas como projeto de justiça e dignidade — continua a ser a única alternativa capaz de responder às crises do presente. Benjamin sabia que a história não é linear: há avanços e recuos, mas a luta nunca cessa. Se o velho mundo insiste em arrastar-nos para o abismo, caberá às novas gerações empurrá-lo, de vez, para as catacumbas da História. Para que, como diria Benjamin, os "amanhãs que cantem" deixem de ser uma utopia e se tornem, finalmente, uma possibilidade tangível.

O futuro não está garantido — terá de ser conquistado. 

Este é o tempo da chegada das trevas:

(Miguel Castelo Branco, in Facebook, 17/08/2025, Revisão da Estátua)


Aceifeira continua imparável a reclamar corpos de crianças. Hoje ao cair da tarde, em Gaza, matou os irmãos Omar, Ranim, Reem e Farah, cujos pais já haviam sido imolados.

O mundo dito dos “nossos valores” nem pestaneja, e até o novo Papa parece ter sido tomado por aquela indiferença característica dos burocratas. Se ainda se justificasse bradar aos céus, ou dar ralhetes ao Altíssimo, tal como o fazia o nosso Padre António Vieira, tudo isto faria sentido.

 Mas não, para quantos se agarram à transcendência, o único deus que se assemelha a este grande silêncio, a esta imperturbabilidade e mutismo é o deus dos estoicos, um ente absolutamente distante.

Por outro lado, para os que apenas se atêm ao plano da imanência e buscam compreender a realidade a partir da própria realidade, este é o tempo do fim da tradição intelectual ocidental, do humanismo e das luzes.  Em ambas as posições, este é  o tempo da chegada das trevas.

Do blogue Estátua de Sal 

Mais um trabalhinho bem feito pelo Ministério Público com sabor a laranja:

MP arquiva processo sobre contratação de histórico do PS sem ouvir Fernando Medina

Quem foram os operacionais da sujidade? O Público, pela mão do Cerejo: Câmara de Lisboa simula consultas ao mercado para contratar histórico do PS

 por Valupi

Do blogue Aspirina B

Não houve espaço no Alasca para a loucura “europeia”:

 (Redacção de Contrapiano, 16/08/2025, Trad. Estátua)

Não há nada mais complicado do que negociações para pôr fim a uma guerra, a menos que um dos dois lados tenha alcançado uma posição esmagadora no terreno. Este certamente não é o caso no conflito na Ucrânia, para a aliança ocidental que apoia Kiev, mas também não o é para Moscovo, que, no entanto, parece ter uma vantagem estratégica muito significativa.

A agora recente cimeira entre Putin e Trump no Alasca, como já dissemos, só pôde ocorrer porque — sem que nenhum conteúdo concreto sobre um possível acordo tenha sido revelado — os dois principais diplomatas claramente alcançaram resultados suficientes para garantir que o encontro entre os dois presidentes pudesse ser apresentado como um “sucesso”. Caso contrário, ele nem sequer ocorreria…

Outras complicações surgem da má qualidade dos negociadores americanos – o principal responsável, Witkoff, é um bilionário do mercado imobiliário sem experiência em diplomacia institucional – e, portanto, da possibilidade de que essa parte não compreenda completamente as consequências concretas do que está a ser discutido.

Essa é a hipótese levantada, por exemplo, pelo próprio jornal alemão “governamental” Bild, segundo o qual Witkoff teria trocado a proposta de “retirada pacífica” das tropas ucranianas das partes dos oblasts de Kherson e Zaporizha ainda sob seu controle (cerca de um quarto dos dois territórios) pela retirada unilateral do exército russo das duas regiões, o que certamente custou muito em termos de recursos, homens e investimentos.

Um mal-entendido dessa magnitude obviamente selaria o fracasso completo da reunião. Mas é precisamente por essa razão — se todos nas redações sabem, todos em Washington e em Moscovo também sabem — que o facto de a reunião ter acontecido parece garantir que foram os alemães, e portanto todos os pequenos anões europeus, que entenderam mal (ou esperavam pior).

Eles que, é claro, estão atualmente fazendo um grande alarido para garantir um lugar nas negociações, tanto para si mesmos quanto para o seu protegido Zelensky, juntando frases cheias de retórica que são aparentemente cheias de bom senso, mas praticamente desprovidas de qualquer fundamento (“Não pode haver processo de paz sem a Ucrânia”, “Não à mudança das fronteiras de Kiev pela força” e assim por diante…).

Estamos a falar aqui de negociações “entre Estados”, e não de um conflito social ou de uma guerra revolucionária, onde, além de “interesses”, também entram em jogo “valores”. E, nesse nível, infelizmente, as coisas acontecem assim: uma guerra termina com uma negociação que prevê aos perdedores a cessão de territórios (especialmente se forem habitados por populações de diferentes nacionalidades e línguas), acordos executáveis e verificáveis para garantir a “segurança” mútua e tudo o mais que for colocado sobre a mesa.

A situação no terreno deixa pouco espaço para a imaginação: a Rússia tem vantagem e, a cada dia que passa, essa vantagem cresce cada vez mais rapidamente.

Também para a população ucraniana, a situação é tal que inverte completamente as orientações que prevaleciam no início do conflito: na última pesquisa Gallup, realizada no início de julho de 2025, 69% dos entrevistados declararam ser a favor de um fim negociado da guerra o mais rápido possível, em comparação com 24% que apoiaram a continuação dos combates até à vitória.

Isso marca uma reversão quase total em relação a 2022, quando 73% eram a favor da Ucrânia lutar até à vitória e 22% preferiam que a Ucrânia buscasse uma solução negociada o mais rápido possível. Mas, mais importante, indica que o tempo disponível para a junta de Zelensky alcançar a paz é agora muito curto. Nenhum exército pode apoiar uma guerra se o povo quiser o contrário…

No entanto, tanto Zelensky quanto a União Europeia parecem querer obstruir uma negociação que os exclui explicitamente, tanto em termos de participação quanto de “localização” (para se encontrarem no Alasca, Putin e Trump não precisaram sobrevoar territórios “neutros” ou hostis e, portanto, não precisaram “pedir permissão”).

Se analisássemos as declarações estrondosas, como fazem os nossos média, teríamos que dizer que “as negociações não podem levar a nenhum resultado”. Mas, como preferimos usar a lógica e o conhecimento, chegamos à conclusão oposta, embora obviamente não seja certo que essas negociações produzam resultados satisfatórios a curto prazo.

Há pelo menos dois problemas principais.

1) A Ucrânia está em ruínas militar, econômica e politicamente. Até Zelensky está a ser explicitamente questionado, e potenciais substitutos estão a surgir (Zaluzhny parece estar na frente). Todas as alternativas políticas, com exceção dos neonazistas “linha-dura”, estão prontas para assinar o acordo de paz, mesmo com perdas territoriais significativas.

2) A União Europeia e a Grã-Bretanha escolheram até agora o caminho de continuar a guerra até ao amargo fim. Dominados por uma ilusão de omnipotência, chegaram ao ponto de declarar, preto no branco, que um “cessar-fogo” (o mesmo que ainda defendiam como pré-condição para qualquer diálogo ontem) era necessário para permitir que a NATO não apenas reabastecesse os stocks de armas para Kiev, mas também enviasse tropas europeias para a Ucrânia.

Isto é, de facto, suicídio político, antes mesmo de ser militar, porque impedir a presença de qualquer contingente da NATO na Ucrânia – assim como a adesão de Kiev à Aliança – é justamente uma das razões da guerra, a ponto de a “neutralidade” estratégica da futura Ucrânia ser uma das condições que a Rússia sempre colocou sobre a mesa.

Uma reflexão final sobre a “credibilidade” da postura belicista da Europa neste momento.

Há poucos dias, a UE agitou a bandeira branca nas negociações tarifárias com Trump. Um grupo heterogêneo, incapaz de chegar a um consenso nem mesmo nas “declarações” (sem custo, em suma) sobre a iminente invasão israelita de Gaza: (França e outros países reconhecem a Palestina, Alemanha e Itália buscaram as assinaturas da Austrália e da Nova Zelândia — que não são exatamente próximas da Europa — para redigir uma crítica tímida a Netanyahu)…

Como é que alguém pode pensar que a União Europeia, essa amiba desprovida de estratégia e sentido histórico, pode “impedir” que um processo de paz seja identificado e imposto pelo “aliado” americano e pelo “inimigo” russo? Por outras palavras: o que pretendem fazer? Entrar em guerra sozinhos (e certamente não todos…) contra uma superpotência equipada com 6.000 ogivas nucleares? E isso, atraindo a hostilidade do seu “aliado”, que financeiramente os maltrata e que também é o seu líder militar?

Talvez esse caminho leve ao desastre de qualquer maneira. Mas não serão Bruxelas e Kiev que o liderarão.

Fonte aqui

Do blogue Estátua de Sal

Marcelo já foi incendiário, agora é bombeiro:

Presidente dá mão ao Governo nos incêndios e fala em coordenação “espectacular”

 por Valupi

Do blogue Aspirina B

Cimeira histórica no Alasca: muito mais do que parece:

(Carlos Fino, Agostinho Costa, Tiago André Lopes,16/08/2025) 


Correu tudo bem. Grande encenação, dois grandes actores. A União Europeia continua em negação, a rilhar a língua despeitada. Os próximos capítulos da novela só podem ser positivos. O palhaço de Kiev está sem pinta de sangue e ontem snifou a sua cocaína em dose tripla… 🙂

Segue excelente texto de Carlos Fino sobre a Cimeira e vídeo com as opiniões do Major-general Agostinho Costa e de Tiago André Lopes.

Estátua de Sal, 16/08/2025


Cimeira histórica no Alasca: muito mais do que parece

(Carlos Fino, in Facebook, 16/08/2025)

Asensação, à primeira vista, é de frustração: só isto? Afinal, tanto barulho para nada?! Mas, olhando melhor, por detrás da aparente inocuidade, está uma enorme mudança – Trump e Pútin viraram a página do confronto total à beira do abismo, retomando a via do confronto regulado. Parecendo pouco, é enorme -verdadeiramente histórico.

O grande vencedor imediato é Pútin, que, de vilipendiado e ostracizado, voltou,

em passadeira vermelha, pela mão (e o aplauso!) de Trump, ao grande palco da política mundial. De onde, na realidade, apesar da hostilidade ocidental, nunca chegou a sair graças aos BRiCS, engenhosa e paciente construção da diplomacia russa. Mas uma coisa é lidar com a versão contemporânea dos antigos Não Alinhados do tempo da Guerra Fria, outra falar de igual para igual com o líder da maior potência mundial,  em encenação mediática  de repercussão universal, prendendo as atenções de todo o mundo.

Trump, por seu turno, a coberto de uma nuvem de ameaças e zigzagues para confundir e despistar os seus poderosos adversários neoconservadores, consegue a proeza de restabelecer as relações com a Rússia praticamente contra tudo e contra todos. Compreendendo que a guerra na Ucrânia está perdida, teve a sagacidade de se colocar de fora ainda a tempo, agindo como se fosse  parte neutra e evitando dessa forma para os EUA mais uma retirada  sem honra nem glória como aconteceu no Vietname e no Afeganistão. Em compensação, vê abrirem-se-lhe as portas de acesso às riquezas da Sibéria e do Ártico, em cooperação com Moscovo. Não é um mau negócio.

A paz eterna está finalmente estabelecida? Não, de modo nenhum, infelizmente! Em declínio, mas ainda maior potência do planeta, os EUA continuarão a contrariar a emergência de potências rivais, em particular a China, que já se perfila no horizonte como seu principal desafio. Mesmo em relação à Rússia, não terminarão amanhã os esforços de a conter, sempre e onde puderem – do Báltico ao Cáucaso, passando pela Ucrânia. Mas, neste último caso, parece haver vontade de uma progressiva retirada, agora que a Rússia está em vias de ganhar.

Os grandes perdedores são manifestamente Zelensky e os europeus,  que insistiram na guerra, totalmente alinhados com a administração Biden, primeiro, e não sabendo depois distanciar-se a tempo quando Trump  sinalizou que ao excessivamente caro intervencionismo externo dos seus antecessores, preferia virar-se para dentro, a fim de Make America Great Again. É triste olhar para  os protagonistas da UE neste cenário.

Obtida a certeza de que não haverá Nato na Ucrânia nem Ucrânia na Nato, os russos vão continuar a avançar até que Kíev aceite as realidades no terreno. Ou que, por força das contradições internas que tendem a acentuar-se com as derrotas, haja eventualmente uma mudança de regime naquela que foi “a primeira de todas as cidades russas”.

Ou seja, de imediato, não haverá cessar-fogo. Mas o tom já mudou na relação entre Moscovo e Washington. E esse é o grande resultado desta aparentemente vazia cimeira histórica no Alasca.